203 Valdete Souto Severo e Lucilla Kluwe Pereira Há um trecho bastante significativo, na decisão de primeiro grau, em que o juízo conclui que “a questão da desapropriação da propriedade pela verificação de eventual situação de trabalho análogo à escravidão ainda é motivo de discussão, em especial porque o tema, objeto do art. 243 da Constituição Federal, com redação pela Emenda Constitucional 81/2014, aguarda regulamentação legislativa”. Conclui, então, que se trata de norma de eficácia limitada, inaplicável, ainda que por analogia, à hipótese. O acórdão segue a mesma linha de argumentação. A segunda decisão foi proferida no processo n. 500042007.2016.4.04.7017/PR, em razão de apelação que pleiteava, dentre outras coisas, a impossibilidade de decretação do perdimento do imóvel. No caso, o Ministério Público ofereceu denúncia imputando aos réus a prática do delito previsto no art. 149 do Código Penal. Os acusados, segundo o relato disposto no acórdão, reduziram sete pessoas, inclusive um adolescente de 16 anos, todas originárias do Paraguai, à condição análoga à de escravo. Os trabalhadores eram submetidos a jornadas exaustivas de até 13 horas de trabalho e estavam sujeitos a condições degradantes de trabalho. Nesse caso concreto, dois dos réus envolvidos no crime foram absolvidos; o apelante, por sua vez, foi condenado a dois anos e um mês a ser cumprido em regime inicial aberto. Entretanto, a pena privativa de liberdade foi substituída por privativa de direitos. Em relação ao art. 243 da Constituição, o argumento da defesa para a sua não-aplicação foi o de que se tratava de bem de família. O juízo reconheceu a previsão constitucional a respeito da expropriação de imóveis utilizados para a exploração de trabalho escravo. Contudo, entendeu também que a eficácia da norma é limitada e, carecendo de lei que a regulamente, concluiu que a sua aplicação não era viável. Ou seja, em ambos os casos apresentados há o entendimento de que a norma constitucional não pode ser aplicada por não se tratar de norma de eficácia plena. Tal posição tem origem nos acordos realizados para a aprovação da Emenda Constitucional durante o processo legislativo. O trâmite que resultou na alteração do art. 243 da CF foi pautado por tentativas de postergar e reduzir a eficácia legal da norma constitucional. Emumprimeiromomento, foi retirado o termo “imediatamente”, que indicava a imediata expropriação de terras em que
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