Casa Leiria Annette Droste Daniela Müller de Quevedo Delio Endres Júnior Haide Maria Hupffer (organizadores) AMBIENTE PERCEPÇÕES 2024
Apoio: Programa de Excelência Acadêmica (PROEX) da CAPES. Processo nº: 88881.845020/2023-01
AMBIENTE PERCEPÇÕES 2024
CONSELHO EDITORIAL EXECUTIVO Dra. Annette Droste Dra. Daniela Müller de Quevedo Dr. Delio Endres Júnior Dra. Haide Maria Hupffer CONSELHO EDITORAL CONSULTIVO Dra. Daiane Bolzan Berlese Dr. Dusan Schreiber Dr. Gabriel Grabowski Dr. Gustavo Marques da Costa Dra. Ledyane Rocha Uriartt Dr. Luciano Basso da Silva Dra. Mara Betânia Brizola Cassanego Dr. Marcelo Pereira de Barros Dr. Rafael Nunes Dos Santos Dra. Roberta Plangg Riegel Dr. Tiago Balem Dra. Vanessa Schweitzer dos Santos
AMBIENTE PERCEPÇÕES 2024 ANNETTE DROSTE DANIELA MÜLLER DE QUEVEDO DELIO ENDRES JÚNIOR HAIDE MARIA HUPFFER (ORGANIZADORES) CASA LEIRIA SÃO LEOPOLDO/RS 2024
AMBIENTE: PERCEPÇÕES 2024 Organizadores: Annette Droste Daniela Müller de Quevedo Delio Endres Júnior Haide Maria Hupffer DOI: https://doi.org/10.29327/5448756 Fotografia da capa: Anderson Moraes da Silva. Doutorando em Qualidade Ambiental – Universidade Feevale. Os textos são de responsabilidade de seus autores. Qualquer parte desta publicação pode ser reproduzida, desde que citada a fonte. Catalogação na Publicação Bibliotecária: Carla Inês Costa dos Santos – CRB: 10/973 Casa Leiria Ana Carolina Einsfeld Mattos Ana Patrícia Sá Martins Antônia Sueli da Silva Gomes Temóteo Glícia Marili Azevedo de Medeiros Tinoco Haide Maria Hupffer Isabel Cristina Arendt Isabel Cristina Michelan de Azevedo José Ivo Follmann Luciana Paulo Gomes Luiz Felipe Barboza Lacerda Márcia Cristina Furtado Ecoten Rosangela Fritsch Tiago Luís Gil Conselho Editorial (UFRGS) (UEMA) (UERN) (UFRN) (Feevale) (Unisinos) (UFS) (Unisinos) (Unisinos) (UNICAP) (Unisinos) (Unisinos) (UnB) A492 Ambiente : percepções 2024 [recurso eletrônico]. / organização Annette Droste… [et. al] ; Programa de Pós-Graduação em Qualidade Ambiental, Universidade Feevale. – São Leopoldo: Casa Leiria, 2024. Disponível em: <http://www.casaleiriaacervo.com.br/direito/ ambiente/percepcoes2024/index.html> Obra bilíngue: português e inglês. Inclui índice remissivo. ISBN 978-85-9509-144-3 1. Ciência ambiental – Qualidade ambiental. 2. Qualidade ambiental – Mudanças climáticas – Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). 3. Qualidade ambiental – Agenda ONU 2030. 4. Qualidade ambiental – Gestão integrada – Bacias hidrográficas. I. Droste, Annette (Org.). II. Universidade Feevale – Programa de Pós-Graduação em Qualidade Ambiental. CDU 504.03
7 Ambiente: percepções 2024 SUMÁRIO 11 Apresentação Annette Droste Daniela Müller de Quevedo Delio Endres Júnior Haide Maria Hupffer 17 Índice de bem-estar urbano como instrumento para identificação e aplicação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável na região metropolitana de Porto Alegre Adriano Sbaraine Eduarda Sthefanie Mittelstadt Fabiane Recktenwalt Jairo Lizandro Schmitt Katiúscia Volkart Panassal Marlon Eduardo Bauer Roseméri Carine Greef Heldt 41 Análise dos relatórios de sustentabilidade de indústrias calçadistas certificadas no Programa Origem Sustentável em relação aos ODS Eduardo Herzer Luciana da Rocha Santos Cátia Aguiar Lenz Daiane Trindade Costa Clauton Fonseca Sampaio Haide Maria Hupffer Andressa Müller 97 Relationship between precipitation, flow, water temperature and soil use with adenovirus contamination in surface water resources Marco Alésio Figueiredo Pereira Tatiana Moraes da Silva Heck Fabiano Costa de Oliveira Rodrigo Staggemeier Daniela Müller de Quevedo Sabrina Esteves de Matos Almeida
Ambiente: percepções 2024 8 115 Mapa conceitual para análise inter-relacional e planejamento estratégico de ações de conservação das orquídeas Delio Endres Júnior Bethania Volmer Spiecher Joshua Tomazzoli Klauck Catiuscia Marcon Annette Droste 147 Relação de casos confirmados de dengue com as projeções climáticas em ummunicípio da região do Vale do Rio dos Sinos/RS Cynthia Vieira Bonatto Joseane Menzen Julyana Sthéfanie Simões Matos Lennon Gabriel Ribas Severo Valessa Santos Daniela Müller de Quevedo Haide Maria Hupffer 175 Análise de indicadores-chave dos relatórios de sustentabilidade de indústrias de cimento do Brasil Thaís Fátima Rodrigues Adroaldo de Lima Cleiton Luís Boufleuher Alexandre Sita Haide Maria Hupffer 195 Impactos relacionados aos resíduos sólidos em bacias hidrográficas brasileiras: o que uma revisão sistemática da literatura nos indica Thaís Fátima Rodrigues Jenifer Panizzon Daniela Müller de Quevedo Marco Alésio Figueiredo Pereira Vanusca Dalosto Jahno 215 Gestão das bacias hidrográficas: uma análise comparativa dos comitês das bacias hidrográficas do Rio dos Sinos, Caí e Gravataí Cleiton Luís Boufleuher Adroaldo de Lima Marco Alésio Figueiredo Pereira Daniela Müller de Quevedo
9 Ambiente: percepções 2024 229 A educação ambiental como estratégia no planejamento e gestão da bacia hidrográfica do Rio dos Sinos Ana Carolina de Quadros Duarte Thaís Rúbia Roque Daniela Müller Quevedo Marco Alésio Figueiredo Pereira 257 A influência da demanda de água para irrigação na disponibilidade hídrica para o consumo humano na bacia do Rio dos Sinos Adriano Sbaraine Eduardo Herzer Daniela Müller de Quevedo 281 Índice remissivo
11 APRESENTAÇÃO Annette Droste Daniela Müller de Quevedo Delio Endres Júnior Haide Maria Hupffer A capa desta edição faz alusão ao desastre ambiental que ocorreu no Rio Grande do Sul emmaio de 2024. Esse evento foi marcado por enchentes devastadoras e movimentos de massa, que afetarammilhares de pessoas, causando perdas significativas de vidas, destruição de propriedades e danos ambientais severos. Embora os capítulos listados não abordem diretamente esse desastre, eles contribuem de forma indireta para uma gestão ambiental necessária para a mitigação de tais eventos. Os estudos apresentados oferecem estratégias e abordagens que podem ser aplicadas para prevenir e minimizar os impactos de eventos climáticos extremos, reforçando a importância de uma abordagem integrada e sustentável na gestão ambiental. A tragédia no Rio Grande do Sul destaca a urgência de ações coordenadas e eficazes para enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas. A presente obra, Ambiente: Percepções 2024, reúne uma coleção de estudos realizados por discentes e docentes das disciplinas de “Seminários Interdisciplinares em Ciências Ambientais” e “Gestão Integrada de Bacias Hidrográficas”, incluindo orientadores e pesquisadores do Programa de Pós-Graduação emQualidade Ambiental da Universidade Feevale. Esses trabalhos refletem um esforço colaborativo e interdisciplinar para abordar questões ambientais críticas, comum foco especial nas mudanças climáticas, nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda da ONU 2030 e na gestão integrada de recursos hídricos. Os capítulos desta obra exploram diversos aspectos relacionados as mudanças climáticas e os ODS, que são desafios globais interligados, desde a análise de indicadores de sustentabilidade até a gestão de recursos hídricos e a educação ambiental. Em particular, a gestão integrada de bacias hidrográficas é destacada como uma estratégia essencial para a adaptação e mitigação dos impactos das
Apresentação 12 mudanças climáticas, alinhando-se aos objetivos globais de sustentabilidade. Cada estudo oferece insights importantes e contribuições significativas para a compreensão e mitigação dos impactos das mudanças climáticas e para o avanço dos ODS em diferentes contextos. O livro é composto por dez capítulos, que serão apresentados resumidamente nos parágrafos seguintes: O primeiro capítulo Índice de Bem-Estar Urbano como Instrumento para Identificação e Aplicação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável na Região Metropolitana de Porto Alegre tem por objetivo estabelecer a relação entre o Índice de Bem-estar Urbano dos municípios pesquisados e os ODS, propostos pela Organização das Nações Unidas, contribuindo com a possibilidade de elaboração de políticas públicas urbanas justas e contemporâneas para o desenvolvimento de cidades sustentáveis. O segundo capítulo, Análise dos relatórios de sustentabilidade de indústrias calçadistas certificadas no Programa Origem Sustentável em relação aos ODS apresenta o resultado de uma análise de relatórios de sustentabilidade de indústrias calçadistas e sua conformidade com os ODS, objetivando discutir a responsabilidade das empresas para criarem indicadores que monitorem a realização dos ODSs, integrando-os estrategicamente aos seus negócios. O terceiro capítulo, Relationship between precipitation, flow, water temperature and soil use with adenovirus contamination in surface water resources apresenta uma análise entre a presença de Mastadenovírus Humano (HAdV) tipo C sorotipos 2 e 5 – HAdV-C (2 e 5) e sorotipos tipo F 40 e 41 – HAdV-F (40 e 41), bem como de Mastadenovírus bovino (BAdV) suspenso na lâmina d'água do rio, correlacionando-os com a precipitação, vazão do corpo d›água, temperatura da água e uso do solo ao redor dos pontos das amostras coletadas no terço inferior da Bacia Hidrográfica do Rio Caí, localizada no estado do Rio Grande do Sul, sul do Brasil. O quarto capítulo, Mapa Conceitual para análise inter-relacional e planejamento estratégico de ações de conservação das Orquídeas, os autores voltam seu estudo para apresentar o “processo de construção de um mapa conceitual aplicado à ampliação colaborativa do conhecimento acerca da conservação de orquídeas” disponibilizando uma ferramenta construtiva e relevante acerca de como conservar as orquídeas, partindo do conhecimento adquirido previamente pelos
13 Apresentação alunos que atuam nos projetos de conservação das Cattleya do RS, incorporando novos termos, integrando-os e “relacionando-os de forma mais complexa e multidisciplinar”. No quinto capítulo, Relação de casos confirmados de dengue com as projeções climáticas em um município da Região do Vale do Rio dos Sinos/RS, os autores iniciam o estudo examinando como a literatura se posiciona sobre o comportamento da dengue em relação as variáveis climáticas para, em sequência, identificar o número de casos de dengue documentados no município, correlacionando-os com os dados de temperatura e precipitação para, ao final, buscar identificar se a influência da temperatura e precipitação é um fator para o aumento do quadro da dengue. O sexto capítulo, Análise de indicadores-chave dos relatórios de sustentabilidade de indústrias de cimento do Brasil, discorre inicialmente sobre mudanças climáticas, a introdução da Agenda ESG na indústria de cimento e as emissões de CO2 desse segmento. Em seguida, são analisados os indicadores-chave relacionados à emissão de CO2 em relatórios de sustentabilidade da indústria cimenteira, observando os impactos ambientais gerados em seus processos. O estudo mostra que as “questões climáticas são sensíveis e relevantes para a indústria do cimento”, visto ser um setor com os maiores índices de emissões inerentes ao seu processo produtivo. Após a análise dos relatórios, os autores pontuam que poucas empresas apresentam de forma clara e objetiva seus indicadores de sustentabilidade. Recomendam para futuros estudos explorar como as ações ambientais podem impactar a cadeia de valor das empresas cimenteiras. No sétimo capítulo, Impactos relacionados aos resíduos sólidos em bacias hidrográficas brasileiras: o que uma revisão sistemática da literatura nos indica, são discutidos os impactos dos resíduos sólidos em bacias hidrográficas brasileiras, a partir de uma revisão sistemática da literatura de abrangência nacional. Os resultados apontamdiversos impactos e contaminações que afetam os corpos hídricos, águas subterrâneas, solos, áreas de proteção ambiental, áreas de preservação de nascentes, degradação de matas ciliares que, além dos danos ao meio ambiente, prejudicam a saúde dos moradores das regiões impactadas, assim como a biodiversidade. O oitavo capítulo, Gestão das bacias hidrográficas: uma análise comparativa dos comitês das Bacias Hidrográficas do Rio dos Sinos, Caí e Gra-
Apresentação 14 vataí, os autores concentram a pesquisa na importância dos Comitês de Bacias Hidrográficas, na complexidade da gestão de uma bacia hidrográfica e na diversidade de atores envolvidos, o que demanda dos comitês irem além da mera conformidade com requisitos legais. Foi realizada uma análise documental e nos sites dos Comitês com base na Lei n.º 9.433/1997, que reges as ações dos Comitês, comparando as práticas de gestão. Os itens avaliados foram: i] Promoção do debate das questões relacionadas a recursos hídricos; ii] Gestão de conflitos relacionados aos recursos hídricos; iii] Aprovação do Plano de Recursos Hídricos da bacia; iv] Execução do Plano de Recursos Hídricos da bacia; v] Proposições ao Conselho Nacional e aos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos; vi] Mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos; vii] Critérios de rateio de custo das obras de interesse comum ou coletivo. No nono capítulo, A Educação Ambiental como Estratégia no Planejamento e Gestão da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos é realizada uma discussão sobre a importância da educação ambiental na gestão de bacias hidrográficas. O estudo inicia refletindo sobre o estresse hídrico, degradação, cenário de escassez, principais desafios no contexto de mudanças climáticas para a gestão sustentável dos recursos hídricos e o alcance estabelecido na Agenda 2023. A educação ambiental é apontada no estudo como uma estratégia para articular e promover ações socioambientais nas bacias hidrográficas, pela possibilidade que oferece de interação interdisciplinar, participativa e holística. Encerrando a coletânea, o décimo capítulo, A Influência da Demanda de Água para Irrigação na Disponibilidade Hídrica para o Consumo Humano na Bacia do Rio dos Sinos, volta-se à construção de cenários para auxiliar na avaliação de possível estresse e escassez hídrica pelo uso da água para irrigação de plantações de arroz na Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos, que é responsável pelo abastecimento de mais de 1 milhão de habitantes. Os cenários construídos, possibilitam observar que o aumento da demanda de água para irrigação eleva o risco de escassez hídrica, principalmente, no trecho baixo da bacia. Temos certeza de que a obra apresentada proporcionará a seus leitores uma visão profunda sobre questões que sensibilizam a sociedade civil, gestores públicos e privados, relacionadas aos im-
15 Apresentação pactos das mudanças climáticas, ODS e a gestão de bacias hidrográficas. A catástrofe ambiental que abalou o estado do Rio Grande do Sul, entre abril e maio de 2024, deixa claro que a mudança no sistema climático é uma realidade que afeta a vida de milhares de pessoas e exige ação imediata dos governantes, empresas e sociedade. Annette Droste Daniela Müller de Quevedo Delio Endres Júnior Haide Maria Hupffer
17 ÍNDICE DE BEM-ESTAR URBANO COMO INSTRUMENTO PARA IDENTIFICAÇÃO E APLICAÇÃO DOS OBJETIVOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NA REGIÃO METROPOLITANA DE PORTO ALEGRE Adriano Sbaraine1 Eduarda Sthefanie Mittelstadt2 Fabiane Recktenwalt3 Jairo Lizandro Schmitt4 Katiúscia Volkart Panassal5 Marlon Eduardo Bauer6 Roseméri Carine Greef Heldt7 1 Advogado. Mestre em Qualidade Ambiental. Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale. E-mail: dradriano@hotmail.com 2 Fisioterapeuta. Mestra em Qualidade Ambiental. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale. E-mail: eduarda.mittelstadt@gmail.com 3 Engenheira Civil. Mestra em Qualidade Ambiental. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale. E-mail: engenheiracivilfabiane@gmail.com 4 Doutor em Botânica pela UFRGS. Professor Adjunto na Universidade Federal de Alagoas. E-mail: jairo.schmitt@penedo.ufal.br 5 Enfermeira. Mestra em Qualidade Ambiental. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale. E-mail: katipanassal@yahoo.com.br 6 Arquiteto e Urbanista, Engenheiro Civil e Designer de Interiores. Mestre em Planejamento Urbano e Regional. Doutorando em Urbanismo pela Universidade de Lisboa. Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale. E-mail: marloneduardobauer@gmail.com 7 Arquiteta e Urbanista. Mestra em Arquitetura e Urbanismo. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale. E-mail: arquiteta.rose@hotmail.com DOI: https://doi.org/10.29327/5448756.1-1
Índice de bem-estar urbano como instrumento para identificação e aplicação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável na região metropolitana de Porto Alegre 18 HIGHLIGHTS • O IBEU e os ODS contribuem para o desenvolvimento de cidades sustentáveis. • Os resultados dos indicadores refletem a qualidade de vida da população. • Embasamento para novas políticas públicas de planejamento urbano. • Os Dados do Censo Demográfico devem ser atualizados. 1. INTRODUÇÃO A cidade está em constante transformação e movimento. Temáticas relacionadas com a mobilidade urbana, tempo de deslocamento das residências para o local de trabalho e vice e versa, qualidade das moradias brasileiras, condições habitacionais urbanas e qualidade e disponibilidade de serviços urbanos têm sido objeto de estudo e reflexão empesquisas e casos de estudo (Vieira; Packer; Zunino, 2015). Novos planos diretores são elaborados e reformulados, e, consequentemente, as políticas de planejamento urbano são implementadas contendo critérios e métodos para a distribuição das principais atividades dentro de uma cidade. Dentro desse contexto, e considerando as necessidades de reformulação dos planos diretores urbanos sugeridos pelo Estatuto das Cidades, Lei nº 10.257/2001 (BRASIL, 2001), surge a oportunidade de elaborar novas políticas públicas que considerem a inserção das metas propostas pela Agenda 2030 e que abordam os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, podendo orientar e consolidar ações para um planejamento urbano condizente com a realidade global (Villaça, 2004). Dessa forma, este trabalho tem por objetivo estabelecer a relação entre o Índice de Bem-estar Urbano dos Municípios que compõe a região metropolitana de Porto Alegre e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, propostos pela Organização das Nações Unidas, contribuindo com a possibilidade de elaboração de políticas públicas urbanas justas e contemporâneas. Para que o seu objetivo fosse atendido, procedeu-se, inicialmente, com a revisão de literatura pertinente ao tema, abrangendo,
19 Adriano Sbaraine, Eduarda Sthefanie Mittelstadt, Fabiane Recktenwalt, Jairo Lizandro Schmitt, Katiúscia Volkart Panassal, Marlon Eduardo Bauer e Roseméri Carine Greef Heldt principalmente, aspectos conceituais; numa próxima etapa, com a demonstração dos procedimentos metodológicos; a seguir, demonstram-se os resultados e as considerações; e, por fim, lista-se o referencial bibliográfico. 2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Em 1950, aproximadamente, 30% da população mundial estava inserida junto à zona urbana das cidades. Atualmente, esse número já ultrapassa mais da metade da população, e, em 2050, as cidades deverão acolher cerca de 70% dos habitantes do Planeta Terra (ONU, 2019). Fato é que, movimentos, a exemplo da globalização, da eclosão de novas tecnologias, da reestruturação produtiva, da remercantilização da força de trabalho e dos novos territórios do capitalismo fizeram emergir uma revalorização das cidades (Kzure- -Cerquera, 2014). Esse crescimento populacional e a respectiva concentração de grande parte das pessoas junto às áreas urbanas acabam gerando desafios para os gestores públicos (Ribeiro et al., 2019, p. 667). Além disso, o movimento migratório do homem do campo para as cidades tem acarretado um aumento significativo da desigualdade social, da qualidade de vida das pessoas, principalmente pela falta de estrutura para oferecer serviços públicos essenciais (Ribeiro et al., 2019). No Brasil, as cidades apresentam um crescimento de forma desordenada, principalmente em regiões metropolitanas e predominantemente industriais. Nesses locais, a falta de investimentos em pesquisas, instrumentos e indicadores adequados, além de políticas públicas a orientar o crescimento espacial das zonas urbanas, impedem a transformação de uma cidade ou uma região econômica em um espaço sustentável e com melhor qualidade de vida para sua população (Magagnin, 2004). Assim, cada vez mais, torna-se necessário estabelecer uma gestão pública pautada em estudos com o uso de indicadores sociais e demográficos, coletados em um menor espaço de tempo, que proporcionem informações atuais e commaior fidedignidade, tarefa essa delegada a empresas de consultoria, agências estatísticas e outras instituições ligadas ao Poder Público (Carley, 1985). Esses indicadores são formulados e utilizados para (i) subsidiar a elaboração e reformulação de planos diretores de desenvolvi-
Índice de bem-estar urbano como instrumento para identificação e aplicação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável na região metropolitana de Porto Alegre 20 mento urbano; (ii) elaborar planos plurianuais de investimentos; (iii) avaliar impactos ambientais decorrentes de implantação de grandes projetos de infraestrutura e desenvolvimento urbano; (iv) justificar o repasse de verbas federais para a implementação de programas sociais e; (v) atender e disponibilizar serviços sociais e coletivos para a população (Jannuzzi; Pasquali, 1999). Como forma de investigar e avaliar as condições urbanas nas cidades brasileiras, o Observatório das Metrópoles, elaborou e divulgou, em 2016, o Índice de Bem-Estar Urbano – IBEU. Esse instrumento foi desenvolvido a partir dos dados do Censo Demográfico de 2010 e permitiu avaliar a dimensão do bem-estar urbano8 de todos os municípios brasileiros – uma amostra que totalizou 5.565 cidades –, evidenciando, assim, os desafios urbanos contemporâneos e essenciais de cada um deles (Ribeiro; Ribeiro, 2016). Originalmente, o IBEU foi formulado pelo Observatório das Metrópoles, pertencente ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT). Para sua composição, utilizou-se, como fonte principal, os dados do Censo Demográfico fornecido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), à exceção dos anos em que não ocorreu o censo. Tal indicador foi projetado a partir da exploração dos dados da Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios sendo que as três dimensões mais importantes analisadas para a sua composição, à época, foram: a mobilidade urbana, as condições das unidades das habitações e o atendimento dos serviços públicos coletivos (Ribeiro; Ribeiro, 2013). No ano de 2016 foi elaborada uma metodologia diferenciada para a construção do novo IBEU. Isso ocorreu em razão da preocupação de que esse índice deveria ser um instrumento importante para a análise e gestão das cidades e que deveria avaliar a dimensão urbana do bem-estar quer pelas dimensões originais do índice quer pelas novas dimensões que foram apuradas pelo Censo Demográfico do ano de 2010. Dentre elas, cabe destacar a mobilidade urbana, as condições ambientais urbanas, as condições habitacionais urbanas, o atendimento aos serviços coletivos urbanos e a infraestrutura urbana (Ribeiro; Ribeiro, 2013).A construção do IBEU, em âmbito municipal, é composta por cinco dimensões de análise, onde cada uma 8 Ribeiro e Ribeiro (2013, p. 11) definemque “o bem-estar urbano de cada lugar é compreendido pela análise relacional do bem-estar urbano de outros lugares, segundo as melhores condições de bem-estar existentes”.
21 Adriano Sbaraine, Eduarda Sthefanie Mittelstadt, Fabiane Recktenwalt, Jairo Lizandro Schmitt, Katiúscia Volkart Panassal, Marlon Eduardo Bauer e Roseméri Carine Greef Heldt dessas é oriunda de diferentes variáveis que contribuem, individualmente, com o mesmo peso matemático para a composição do fator final do Índice (Ribeiro; Ribeiro, 2013). Portanto, o IBEU pode ser definido como o resultado de uma média aritmética de cinco dimensões, as quais são definidas considerando as propriedades necessárias do espaço urbano que podempossibilitar condições coletivas de vida para seus habitantes, sendo elas: Quadro 1 – Dimensões e variáveis do IBEU DIMENSÕES VARIÁVEIS Mobilidade urbana D1 Criada a partir do indicador de deslocamento casa- -trabalho, considerando o tempo de deslocamento que as pessoas ocupadas e que trabalham fora do domicílio, retornam diariamente para casa, utilizando o trajeto de ida entre o domicílio de residência e o local de trabalho. É considerado como tempo de deslocamento adequado quando as pessoas gastam até 1 hora por dia no trajeto casa-trabalho. Condições ambientais urbanas D2 Concebida a partir de três indicadores: arborização do entorno dos domicílios, esgoto a céu aberto no entorno dos domicílios e lixo acumulado no entorno dos domicílios. O indicador de arborização no entorno dos domicílios é obtido a partir da proporção de pessoas quemoramemdomicílios cujo entorno possui arborização. O indicador de esgoto a céu aberto no entorno dos domicílios é construído a partir da proporção de pessoas que moram em domicílios cujo entorno não possui esgoto a céu aberto. O indicador de lixo acumulado no entorno dos domicílios é obtido a partir da proporção de pessoas que moram em domicílios cujo entorno não possui lixo acumulado. Condições habitacionais urbanas D3 Compreende cinco indicadores sendo eles: aglomerado subnormal (proporção de pessoas do município que não moram em aglomerado subnormal), densidade domiciliar(construído a partir da razão entre número de pessoas no domicílio e número de dormitório), densidade morador/banheiro ( adequado o domicílio que possui até 4 pessoas por banheiro) , material das paredes dos domicílios(adequado o domicílio cujas paredes externas são do tipo de alvenaria com revestimento ou madeira apropriada para construção) e espécie do domicílio (adequado os domicílios do tipo casa, casa de vila ou condomínio ou apartamento). Foram considerados como espécie de domicílios inadequados: habitação em casa de cômodo, cortiço ou cabeça de porco; tenda ou barraca; dentro de estabelecimento; outro (vagão, trailer, gruta, etc.).
Índice de bem-estar urbano como instrumento para identificação e aplicação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável na região metropolitana de Porto Alegre 22 Atendimento aos serviços coletivos urbano D4 Concebida a partir de quatro indicadores: atendimento adequado de água, atendimento adequado de esgoto, atendimento adequado de energia e coleta adequada de lixo. Esses são indicadores que expressam os serviços públicos essenciais para a garantia de bem-estar urbano, independentemente de ser ofertado por empresas públicas ou por empresas privadas através de concessão pública. Infraestrutura urbana D5 Compreendida por sete indicadores: iluminação pública, pavimentação, calçada, meio-fio/guia, bueiro ou boca de lobo, rampa para cadeirantes e logradouros. Esses indicadores expressam as condições de infraestrutura na cidade que podem possibilitar (quando da sua existência) melhor qualidade de vida para as pessoas, estando relacionados com a acessibilidade, saúde e outras dimensões do bem-estar urbano. Fonte: Elaborado pelos autores, 2022; adaptado de Ribeiro e Ribeiro (2013). Essas variáveis, categorizadas em indicadores (e em conjunto), representam a realidade de uma cidade e permitem atribuir um resultado numérico que identifica o Índice de Bem-Estar Urbano de um determinado município quando da composição final do indicador. A partir da apuração desse valor, tem-se um resultado esperado por cidade, em um ranking nacional, dentre todos os municípios brasileiros, classificando aqueles que possuem a maior e a menor posição em nível nacional (Ribeiro; Ribeiro, 2013). Paralelamente à elaboração do IBEU, em setembro de 2015, como objetivo de unir forças e combater os principais desafios voltados às questões sociais, econômicas e ambientais em todo o mundo, a Organização das Nações Unidas (ONU) propôs aos países membros a criação da Agenda 2030, documento que estabelece os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) (Figura 1), divididos em 169 metas que compreendem quatro principais dimensões: (i)Social; (ii) Ambiental; (iii) Econômica e; (iv) Institucional. A meta de cada um dos 193 países que aderiramaos compromissos fixados por esse instrumento, é cumprir todos os seus objetivos até o ano de 2030 (Moreira et al., 2019). Os 17 ODS são integrados, ou seja, reconhecem que a ação em uma área afetará os resultados em outras e que o desenvolvimento deve equilibrar a sustentabilidade social, econômica e ambiental (PNUD, 2022). Considera-se que as metas e objetivos expressos nos
23 Adriano Sbaraine, Eduarda Sthefanie Mittelstadt, Fabiane Recktenwalt, Jairo Lizandro Schmitt, Katiúscia Volkart Panassal, Marlon Eduardo Bauer e Roseméri Carine Greef Heldt ODS podem ser particularmente importantes como um acordo social com um bem-estar geral e mínimo (Marques, 2020). Figura 1 – Objetivos do Desenvolvimento Sustentável Fonte: Elaborado pelos autores, 2022. Portanto, a partir dessa breve revisão teórica, levanta-se a hipótese de que, para compreender a situação de implementação da Agenda da ONU, torna-se necessário identificar e relacionar o IBEU dos municípios que compõem a Região Metropolitana de Porto Alegre com os ODS. Para tal desiderato, elegeram-se dois munícipios da RMPA – um deles que apresenta o maior e o outro o menor IBEU –, permitindo, assim, apropriar-se deste índice e seus indicadores como parâmetro inicial de identificação, avaliação e verificação do atendimento e evolução quanto às recomendações propostas pela Agenda da ONU.
Índice de bem-estar urbano como instrumento para identificação e aplicação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável na região metropolitana de Porto Alegre 24 3. METODOLOGIA Trata-se de um estudo analítico, descritivo, transversal e retrospectivo, de natureza qualitativa, e que tem como foco a Região Metropolitana de Porto Alegre (RMPA), considerada a regiãomais urbanizada do estado do Rio Grande do Sul, a qual é composta por 14 municípios. A metodologia proposta para a presente pesquisa está dividida em três etapas distintas a saber: fase exploratória, fase generativa9 e fase avaliativa (Figura 2). Figura 2 – As fases da metodologia Fonte: Elaborado pelos autores, 2022. No decorrer da fase generativa, combase nametodologia Delphi (MARQUES; FREITAS, 2018, p. 389-415), foram importadas informações oriundas do bando de dados do IBEU, onde, com o auxílio do software Microsoft Excel, foram selecionados os municípios que compõem a Região Metropolitana de Porto Alegre (RMPA). A partir desta seleção e arranjo dos resultados, identificou-se comomaior Índice de Bem-Estar Urbano (IBEU) dessa região, o município de Dois 9 Na fase generativa, será utilizada a metodologia descrita por Yin (2016, p. 157), o qual propõe cinco fases: (i) compilar a base de dados; (ii) decompor os dados; (iii) recompor e arranjar os dados; (iv) interpretar e (v) concluir.
25 Adriano Sbaraine, Eduarda Sthefanie Mittelstadt, Fabiane Recktenwalt, Jairo Lizandro Schmitt, Katiúscia Volkart Panassal, Marlon Eduardo Bauer e Roseméri Carine Greef Heldt Irmãos (0,87), e, com o menor IBEU, o município de Viamão (0,53), sendo que ambos serão objeto de análise. Em relação à caracterização dos municípios, utilizados como pano de fundo para a presente pesquisa, o primeiro deles, Dois Irmãos (Figura 3), é uma cidade situada a 175 mde altitude em relação ao nível do mar, e, em razão dessa característica é conhecida, também, como Portal da Serra. Sua história está muito ligada à colonização alemã, sendo que os primeiros imigrantes lá se estabeleceram a partir do ano de 1825. Até o ano de 1959, Dois Irmãos era considerada Distrito de São Leopoldo, porém, nesse mesmo ano, elevado à condição de município (IBGE, 2022). Em 2021 a população estimada era de 33.547 dois-irmãosenses espalhados por uma área de 66,114 Km². No ano de 2019, o PIB per capita era de R$ 63.947,67 e ostentava um IDHM (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal) de 0,743 (IBGE, 2022). A economia do município gira em torno do comércio, da agricultura (mandioca, milho, cana-de-açúcar, feijão e batata doce), dos serviços e da fabricação de calçados, principalmente. Em 2018, o PIB de Dois Irmãos representou um total de R$ 2.001.800,00. Seu desenvolvimento socioeconômico é considerado alto (Sebrae, 2020). Figura 3 – Localização geográfica do município de Dois Irmãos Fonte: Elaborado pelos autores, 2022. O segundo município, Viamão (Figura 4), possui um passado cunhado pela história, pois a riqueza de seus campos fez com que, no século XVIII, muitos colonizadores lá se fixassem. No ano de 1880, Viamão desmembrou-se de Porto Alegre para se tornar
Índice de bem-estar urbano como instrumento para identificação e aplicação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável na região metropolitana de Porto Alegre 26 vila e sede do município. A importância histórica e social de Viamão iniciou quando foi sede das primeiras estâncias de criação de gado. Os grandes rebanhos de bovinos e equinos, que existiam na campanha do Rio do Prata, transitavam por Viamão para serem comercializados em Laguna (SC). O município, inclusive, foi capital do estado até o ano de 1773. (IBGE, 2022). A população da cidade, no ano de 2021, alcançava o marco de 257.330 habitantes que atendem pelo gentílico de viamonenses e ocupam uma área de 1.496,506 Km². Em 2019, o PIB per capita era de R$ 15.830,63 e ostentava um IDHM (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal) de 0,717 (IBGE, 2022). Viamão concentra sua economia junto ao comércio, à indústria e à prestação de serviços. No ano de 2018, o PIB de Viamão alcançou a cifra de R$ 3.743.506.026,00. Sua classificação em relação ao desenvolvimento socioeconômico é considerada média (SEBRAE, 2020). Figura 4 – Localização geográfica do município de Viamão Fonte: Elaborado pelos autores, 2022. 4. RESULTADOS E DISCUSSÕES De posse dessas informações, correspondentes às dimensões avaliadas no IBEU de ambas as cidades, elaborou-se a Figura 5 a qual apresenta os resultados encontrados:
27 Adriano Sbaraine, Eduarda Sthefanie Mittelstadt, Fabiane Recktenwalt, Jairo Lizandro Schmitt, Katiúscia Volkart Panassal, Marlon Eduardo Bauer e Roseméri Carine Greef Heldt Figura 5 – Índice de Bem-Estar Urbano as dimensões de análise Fonte: Elaborado pelos autores, 2022. Em preço às informações da Figura 5, constata-se que a dimensão do IBEU que possui maior discrepância entre ambos os municípios é a D1 (mobilidade urbana). Ao passo em que Dois Irmãos alcançou o índice de 0,97, Viamão apresentou 0,39. A D1 está relacionada com os objetivos 3 (saúde e bem-estar) e 11 (cidades e comunidades sustentáveis) dos ODS. Quanto à mobilidade urbana, deve-se ter em mente sobre as iniciativas da Poder Público local que rejeitam a utilização prioritária do automóvel, ideal esse que permite avançar nas questões relativas à tal temática e que geram melhores condições de vida para a população das cidades (Callefi et al., 2017, p. 5). Medidas de implementação de “zonas livres de automóveis”, de moderação da circulação e de prioridade ao pedestre, que fomentem a caminhada e o uso da bicicleta, reduzindo os riscos para a utilização desses modos de transporte e promovendo a atratividade das cidades, são algumas das alternativas propostas por Silva (2013). Em se tratando da dimensão D2 do IBEU (condições ambientais), o município de Dois Irmãos apresentou um índice de 0,97 enquanto Viamão o de 0,53. Essa dimensão possui relação com os ODS
Índice de bem-estar urbano como instrumento para identificação e aplicação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável na região metropolitana de Porto Alegre 28 3 (saúde e bem-estar), 6 (água potável e saneamento, 11 (cidades e comunidades sustentáveis) e 15 (vida terrestre). Nesse prisma, é importante frisar que as condições ambientais umbilicadas ao saneamento não se referem tão somente à coleta e tratamento de água e esgoto, como é comumente imaginado, mas envolve, também, ações de limpeza pública (associadas à coleta de resíduos sólidos), drenagem pluvial e o controle de vetores de doenças transmissíveis (Uhr; Schmechel; Uhr, 2016). A disponibilidade dos serviços de saneamento básico é uma questão bastante importante, pois sua ausência ou a deficiência pode levar a diversos problemas relacionados à saúde e bem-estar da sociedade, acarretando doenças de veiculação hídrica (Uhr; Schmechel; Uhr, 2016), o que constitui em um problema de saúde pública muito comum em países de desenvolvimento, encontrando-se fortemente associada ao modelo socioeconômico praticado e ao fato da população mais vulnerável ser justamente aquela excluída dos benefícios do desenvolvimento (Uhr; Schmechel; Uhr, 2016). Comrelação à dimensãoD3 do IBEU (condições habitacionais), a cidade de Dois Irmãos teve como índice 0,89. Viamão, por sua vez, este valor caiu para 0,66. A dimensão D3 possui conexão com os ODS 3 (saúde e bem-estar), 6 (água potável e saneamento) e 11 (cidades e comunidades sustentáveis). A garantia de acesso às dignas condições habitacionais à parcela da população considerada de baixa renda é indispensável para atender as necessidades dos grupos sociais mais vulneráveis (Monteiro; Veras, 2017). A concentração de habitantes em certas áreas da cidade não só responde por condições (desiguais) de acesso à terra, mas também gera dinâmicas específicas, tanto fortalecendo laços comunitários como sinal de perpetuação de formas de exclusão social (Mera; 2020, tradução nossa). A não efetivação do direito àmoradia acarreta danos a diversos outros direitos como o direito ao trabalho, à integridade física, à educação, à saúde, à privacidade, à vida familiar e à participação política (Lima, 2020). Por conseguinte, a dimensão D4 do IBEU (atendimento aos serviços coletivos urbanos), ambas as cidades demonstraram índices praticamente no mesmo patamar: 0,82 e 0,69 respectivamente para Dois Irmãos e Viamão. Essa dimensão demonstra a sua relação com os ODS 3 (saúde e bem-estar), 6 (água potável e saneamento), 7 (energia limpa e acessível), e 11 (cidades e comunidades sustentá-
29 Adriano Sbaraine, Eduarda Sthefanie Mittelstadt, Fabiane Recktenwalt, Jairo Lizandro Schmitt, Katiúscia Volkart Panassal, Marlon Eduardo Bauer e Roseméri Carine Greef Heldt veis). São indicadores, portanto, que expressam os serviços públicos essenciais para garantia de bem-estar urbano, independentemente de serem ofertados por empresas públicas ou por empresas privadas por meio de concessão pública (Salata; Costa, 2013). Sobre tal aspecto, entende-se não ser possível garantir segurança, vida sadia, nummeio ambiente equilibrado, tudo a respeitar a dignidade humana, se os serviços públicos essenciais urgentes não forem contínuos (Chimenti, 2015). Por fim, quanto à dimensão D5 do IBEU (infraestrutura urbana), sua afinidade vem a ser com os 7 (energia limpa e acessível), e 11 (cidades e comunidades sustentáveis). O município de Dois Irmãos apresentou um índice de 0,68 e Viamão de 0,37. O crescimento acelerado da população é um dos fatores que comprometem a manutenção do sistema de infraestrutura urbana, gerando, assim, consequências para uma considerável parcela dos munícipes (Vieira Filho et al., 2013). A infraestrutura urbana é um fator que deve propiciar os meios necessários ao desenvolvimento das atividades político-administrativas, entre os quais se inclui a gerência da própria cidade (Zmitrowicz; Neto, 1997). Sublinha-se que, uma infraestrutura urbana deficitária dá origem, de acordo com Vieira Filho et al. (2013), a grandes desigualdades sociais, aumento das taxas de desemprego e, finalmente, à saturação de diversos setores de trabalho. Pertinente acrescentar, a título ilustrativo, o estudo realizado por Pereira et al. (2018), que essa dimensão, na cidade de São Luiz, capital do estado do Maranhão, foi a que obteve a mentor pontuação; situação que vai ao encontro dos resultados aqui obtidos. Os autores (Pereira et al., 2018), naquele município, relataram que a infraestrutura urbana estaria comprometida em razão da falta de rampa de acesso para cadeirantes (acessibilidade) e de bueiros ou bocas de lobo que possam dar o devido destino ao escoamento e drenagem de águas pluviais. Para a composição da análise subsequente, utilizou-se a base de dados disponibilizada pelo Instituto das Cidades Sustentáveis que, por meio do Programa Cidades Sustentáveis, monitora e acompanha a evolução dos ODS no Brasil. Igualmente, foram consideradas as informações de acompanhamento da evolução dos ODS propostas pela Confederação Nacional dos Municípios.
Índice de bem-estar urbano como instrumento para identificação e aplicação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável na região metropolitana de Porto Alegre 30 Figura 6 – Pontuação dos ODS dos municípios de Dois Irmãos e Viamão Fonte: Elaborado pelos autores, 2022. De acordo com a Figura 6 e o Quadro 2, a seguir, podemos, imediatamente, descartar o ODS 15, por não ter informações disponibilizadas, impedindo, portanto, que seja realizada uma relação entre o IBEU e os indicadores que compõem este ODS. Cabe destacar que, ao relacionar os ODS com o Índice de Bem-Estar Urbano, percebe-se que o ODS que apresenta maior relação com o IBEU é o de número 11, sendo que 5 dos seus objetivos específicos estão relacionados com o IBEU. Na sequência, os ODS 6 e 3, onde 3 objetivos específicos em cada um estão relacionados com o IBEU. Ainda, no ODS 7, foram diagnosticados 2 objetivos específicos relacionados com o IBEU e na ODS 15, apenas 1. O Quadro 2 apresenta a correlação entre as dimensões e indicadores do IBEU e os objetivos gerais e específicos dos ODS.
31 Adriano Sbaraine, Eduarda Sthefanie Mittelstadt, Fabiane Recktenwalt, Jairo Lizandro Schmitt, Katiúscia Volkart Panassal, Marlon Eduardo Bauer e Roseméri Carine Greef Heldt Quadro 2 – Correlação entre IBEU e OD IBEU ODS Dimensão Indicadores Objetivo geral Objetivos específicos Mobilidade urbana (D1) Deslocamento casatrabalho Objetivo 3 Item 3.6 Objetivo 11 Item 11.2 Condições ambientais (D2) Arborização no entorno dos domicílios Objetivo 15 Item 15.2 Esgoto a céu aberto no entorno dos domicílios Objetivo 3 Item 3.3 Objetivo 6 Item 6.2 Lixo acumulado no entorno dos domicílios Objetivo 3 Item 3.3 Objetivo 6 Item 6.2 Objetivo 11 Item 11.6 Condições habitacionais (D3) Aglomerado subnormal Objetivo 11 Item 11.1 Densidade domiciliar Objetivo 3 Item 3.7 Objetivo 11 Item 11.1 Densidade morador/banheiro Objetivo 6 Item 6.2 Objetivo 11 Item 11.1 Material das paredes dos domicílios Objetivo 11 Item 11.1 Item 11.c Espécie dos domicílios Objetivo 11 Item 11.1 Atendimento de serviços coletivos urbanos (D4) Atendimento de água Objetivo 6 Item 6.1 Item 6.4 Objetivo 11 Item 11.1 Atendimento de esgoto Objetivo 3 Item 3.3 Objetivo 6 Item 6.2 Objetivo 11 Item 11.1 Atendimento de energia Objetivo 7 Item 7.1 Item 7.b Objetivo 11 Item 11.1 Coleta de lixo Objetivo 3 Item 3.3 Objetivo 11 Item 11.1 Item 11.6 Infraestrutura urbana (D5) Iluminação pública Objetivo 7 Item 7.1 Item 7.b Pavimentação Objetivo 11 Item 11.1 Calçada Objetivo 11 Item 11.1 Meio-fio/guia Objetivo 11 Item 11.1 Bueiro ou boca de lobo Objetivo 11 Item 11.1 Rampa para cadeirantes Objetivo 11 Item 11.1 Item 11.2 Item 11.3 Identificação e logradouros Objetivo 11 Item 11.1 Item 11.2 Item 11.3 Fonte: Elaborado pelos autores, 2022 A Tabela 1 apresenta os ODS selecionados, bem como a quantidade de objetivos específicos propostos nessa agenda, bem como aqueles que possuem relação com o IBEU. Nela ainda constam os percentuais dessa relação.
Índice de bem-estar urbano como instrumento para identificação e aplicação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável na região metropolitana de Porto Alegre 32 Tabela 1 – Quantidade de objetivos específicos dos ODS vinculados ao IBEU ODS Objetivos específicos Quantidade de objetivos que têm relação com o IBEU Relação 3 13 3 23,08% 6 8 3 37,50% 7 5 2 40,00% 11 10 5 50,00% 15 12 1 8,33% Fonte: Elaborado pelos autores, 2022. Em relação aos ODS 3, 6, 7 e 11, a Figura 7 relaciona as médias entre os percentuais que foram agrupados pelo Quadro 2 em cada município com as médias de cada dimensão que compõem o IBEU de ambas as cidades que são objeto de análise do presente estudo. Figura 7 – Comparativo parcial e geral do IBEU de Dois Irmãos e Viamão 15 12 1 8,33% Fonte: Elaborado pelos autores, 2022 Em relação aos ODS 3, 6, 7 e 11, a Figura 7 relaciona as médias entre os percentuais que foram agrupados pelo Quadro 2 em cada município com as médias de cada dimensão que compõem o IBEU de ambas as cidades que são objeto de análise do presente estudo. Figura 7 – Comparativo parcial e geral do IBEU de Dois Irmãos e Viamão Fonte: Elaborado pelos autores, 2022. Após estas análises, constatou-se que o IBEU da cidade de Viamão é inferior àquele apresentado pelo município de Dois Irmãos. Tal cenário tende a refletir na qualidade de vida da população, principalmente porque algumas variáveis desse indicador possuem intrínseca relação com alguns dos ODS, os quais não estão satisfatoriamente atendidos em ambos os municípios. Em apreço à essa realidade, torna-se necessário a compilação e apresentação da situação encontrada em todos os ODS de ambos os municípios objetos de estudo, o que se apresenta na Figura 8, a seguir:
33 Adriano Sbaraine, Eduarda Sthefanie Mittelstadt, Fabiane Recktenwalt, Jairo Lizandro Schmitt, Katiúscia Volkart Panassal, Marlon Eduardo Bauer e Roseméri Carine Greef Heldt Figura 8 – Comparativo geral do IBEU versus ODS em Dois Irmãos e Viamão Fonte: Elaborado pelos autores, 2022. Cumpre ponderar que consiste em um desafio permanente, de responsabilidade dos governos e da sociedade civil, o cumprimento dos objetivos propostos pela Agenda 2030. Metas e objetivos acabam testando a capacidade dos países de organizar e coordenar instrumentos, processos e estruturas dentro das administrações públicas nacionais (e locais) para alcançar os objetivos ambientais, econômicos e sociais. Trata-se, pois, de reformar instituições e práticas sociais para garantir uma trajetória de desenvolvimento sólida e equitativa e que proporcione melhores condições de vida à presente e às futuras gerações e que dependerão não apenas da introdução de novas políticas e programas, mas também na melhoria dos arranjos de governança e instituições para a tomada de decisões. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os indicadores ora utilizados (IBEU e ODS) estão intrinsicamente ligados à consolidação das atividades de planejamento do se-
Índice de bem-estar urbano como instrumento para identificação e aplicação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável na região metropolitana de Porto Alegre 34 tor público ao longo do século. Ambos se demonstram ferramentas de grande valia para que sejammanipulados (individual ou em conjunto), a fim de nortear o Poder Público a empreender uma administração pautada na melhoria contínua dos seus espaços, garantindo a manutenção da qualidade de vida e o acesso a condições ambientais dignas. Esses indicadores, quando bem empregados, enriquecem a interpretação empírica da realidade social e orientamde formamais perficiente a análise, formulação e implementação de políticas sociais. Na negociação das prioridades sociais, os indicadores dessa natureza podem contribuir no apontamento da magnitude das carências a atender nas diversas áreas de intervenção. Destaca-se, num primeiro momento, a necessidade de que o IBEU, que traduz o bem-estar urbano citadino, carece de uma permanente atualização de seus dados, eis que as informações contidas no banco de dados consultado são oriundas do senso realizado no ano de 2010. Assim, considerando que as dimensões estudadas a partir desse indicador demonstram relevância social, um diagnóstico pautado em dados atuais traria, a priori, chances de um maior sucesso no processo de formulação e implementação de políticas públicas. Quanto a isso, sinala-se que alguns parâmetros, analisados a partir do IBEU, demonstraram-se baixos. Todavia, ao considerar o desempenho dos mesmos parâmetros, por meio dos ODS, o resultado foi melhor, o que se deve, em tese, ao fato de que os dados contidos na base do cálculo do IBEU estejam desatualizados, uma vez que se baseiam no censo do início da década passada. Ainda, é importante salientar que os municípios analisados não demonstram desempenho total em relação a ambos os indicadores. Em que pese Dois Irmãos ter evidenciado resultados mais satisfatórios, existem melhorias a serem implementadas por parte governo municipal. Entretanto, Viamão foi a cidade que demonstrou resultados bastante insatisfatórios, donde se depreende a necessidade de uma forte intervenção do gestor público, o que muito provavelmente possa ser realizado com base no trabalho desempenhado pela administração do município de Dois Irmãos. Acredita-se que os resultados insatisfatórios, tanto em relação a um quanto a outro município, sejam em decorrência de políticas públicas malsucedidas. Também, constatou-se que os indicadores aqui abordados não se excluem. Pelo contrário: eles se complementam. A metodo-
35 Adriano Sbaraine, Eduarda Sthefanie Mittelstadt, Fabiane Recktenwalt, Jairo Lizandro Schmitt, Katiúscia Volkart Panassal, Marlon Eduardo Bauer e Roseméri Carine Greef Heldt logia ora aplicada poderá servir de amparo às demais pesquisas e atividades por parte do Poder Público, e poderá, também, utilizar-se de outros indicadores que porventura existam ou venham a surgir. REFERÊNCIAS BRASIL. Presidência da República. Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/leis/leis_2001/l10257.htm. Acesso em: 12 jul. 2022. CALLEFI, Mário Henrique Bueno Moreira; MIOTTO, José Luiz; CAMPO, Joandson Fernandes; RAMOS, Diego Vieira; MACHADO, André Fogolin; REGHIN FILHO, José Ricardo. A temática das cidades sustentáveis no brasil. In: X Encontro Internacional de Produção Científica. Anais [...]. Maringá, 2017. Disponível em: https://rdu.unicesumar.edu.br/bitstream/123456789/1402/1/epcc--79625.pdf. Acesso em: 2 jul. 2022. CARLEY, Michael. Indicadores Sociais: teoria e prática. Rio de Janeiro: Zahar, 1985. CHIMENTI, Bruna. A interrupção da prestação de serviços públicos essenciais e a dignidade da pessoa humana. 2015. Disponível em: https://brunachimenti.jusbrasil.com.br/ar tigos/174499634/a-interrupcao-da-prestacao-de-servicos- publicos-essenciais-e-a-dignidade-da-pessoa-humana. Acesso em: 2 jul. 2022. MARQUES, Joana Brás Varanda. FREITAS, Denise de. Método DELPHI: caracterização e potencialidades na pesquisa em educação. Pro.posições, São Carlos , v. 29, n. 2 (87), p. 389-415, mai./ago. 2018. Disponível em: https://www.scielo.br/j/pp/a/ MGG8gKTQGhrH7czngNFQ5ZL/?format=pdf&lang=pt. Acesso em: 15 maio 2022. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA ESTATÍSTICA (IBGE). Dois Irmãos, Rio Grande do Sul – RS Histórico. 2022. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rs/dois-irmaos/panora ma. Acesso em: 28 maio 2022.
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