Do ciberespaço ao capitalismo de vigilância: uma nova configuração de poder arquitetada sobre dados 142 tado e quais os anúncios que chamam mais a sua atenção, o Google percebeu que é possível extrair preferências, hábitos, comportamentos, gostos e tendências de buscas que podem ser transformadas em informações que, posteriormente, são analisadas e em sequência passam a abastecer “um novo e diferenciado mercado que explora, principalmente, o superávit comportamental e o transforma em capital”. Os rastros alimentam os mecanismos preditivos de consumo e escolhas e o indivíduo de “usuário passa a passa a ser o produto e sua decisão é previsível, controlada e vigiada” (Marques; Silva, 2022). Na análise de Scofield Jr. (2023, p. 580) sobre a tese do capitalismo de vigilância, o autor pontua que Zuboff parte do Google para dissertar sobre o regime predatório que com a intenção velada de “ampliar o acesso humano ao conhecimento, acabou se tornando a maior plataforma de acesso, por gente nem sempre bem-intencionada, ao conhecimento do que fazem e pensam os seres humanos”. O Google, depois seguido por outras plataformas, entenderam que “o valor do serviço que prestam não está exatamente na busca, no entretenimento ou nas vendas, mas na coleta de dados sobre o que procuram as pessoas — seus desejos, seus interesses, suas repulsas, suas manias, seus vieses, suas crenças, seus hábitos”. No ato individual de dar cliques, likes de compartilhamentos em outras redes, os usuários não se deram conta de que estavam ajudando “a criar um gigantesco banco de dados de comportamento humano, que é a principal matéria-prima superavitária — a sobra da informação que as plataformas precisam para entender o que usuário procura — do novo regime” (Scofield Jr., 2023, p. 580). A virada de chave no que se refere ao direcionamento da publicidade oriunda da extração de dados comportamentais no ambiente digital se dá quando as informações sobre as interações dos usuários passam a ser utilizadas como uma nova forma de lucro, eis que os dados são extraídos com o objetivo de ler a mente do usuário “a fim de combinar anúncios com seus interesses, que, por sua vez, eram deduzidos dos vestígios colaterais do comportamento on-line”. Esses mecanismos tornaram possível o conhecimento sobre um indivíduo específico, “num tempo e espaço específicos”, bem como sobre seus pensamentos, sentimentos e o que está fazendo (Zuboff, 2021, p. 102).
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