245 Ana Paola de Castro e Lins e José Anchieta Oliveira Feitoza do colonialismo é determinar quem é o sujeito do poder, o sujeito do direito, o sujeito que merece ser cidadão. E isso se dá por meio do apagamento, da desconsideração, de todo aquele que não é esse sujeito de poder. O binarismo de gênero, que estrutura o mundo entre homem e mulher, a partir do sexo biológico, coloca no lugar da anormalidade toda e qualquer pessoa que opera de maneira diferente dessa lógica (Bourdieu, 2022), ou seja, as populações LGBTQIAPN+. Essa lógica binária foi levada para todo o planeta alçada à condição de status quo por meio da violência colonial, sobrevalorizando as diferenças entre homem e mulher, a partir do sexo biológico, e ainda se faz presente nas operações algorítmicas. O projeto Excavating AI, por exemplo, que estudou políticas de bancos de imagens, como a ImageNet, encontrou arbitrariedade e disparidade acentuada de gênero em relação à presença de conteúdo sexualmente explícito. Essa classificação das imagens e das situações e pessoas envolvidas usou a lógica algorítmica, que reproduziu a visão de mundo amparada em preconceitos e estereótipos e que, facilmente, pode virar discriminação contra as pessoas pertencentes a grupos vulneráveis, entre os quais as pessoas LGBTQIAPN+ (Silva, 2021, p. 94-96). Umas das áreas mais sensíveis a pessoas de orientação sexual ou identidade de gênero dissidentes é o exercício do direito ao trabalho. E essa é justamente uma das áreas que levantam preocupações de estudiosos do tratamento de dados, já que o tratamento por parte de recrutadores e empregadores pode aumentar a violação a direitos (Teffé, 2022, p. 20). Estudos já detectaram práticas algorítmicas discriminatórias que envolvemquestões de gênero, no que diz respeito às mulheres. A ferramenta curricula vitae, criada para facilitar o recrutamento, identificava os candidatos mais aptos aos perfis das vagas, mas penalizou todas as fichas de mulheres. Isso porque a base de dados foi alimentada majoritariamente por perfis masculinos e, por meio do machine learning, aprendeu que as características relevantes eram associadas a homens (Rouxinol, 2021, p. 1017). Diante da ausência de regulação legal específica para as pessoas LGBTQIAPN+, da vulnerabilidade que as orientações sexuais e identidades de gênero dissidentes atrelam às pessoas e das violações reais e em potencial e das discriminações transportadas das dinâmicas sociais para as dinâmicas digitais mediadas por algorit-
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