255 Mauricio Dal Castel ciais na busca de escala, escopo e ação. Embora instrumentarianismo e totalitarismo sejam espécies distintas, cada uma anseia pela totalidade, por mais que as formas desta sejam muito distintas. O totalitarismo a busca como condição política e se apoia na violência para abrir seu caminho. Já o instrumentarianismo busca a totalidade como condição de dominação do mercado, e se apoia no controle dela sobre a divisão da aprendizagem na sociedade, possibilitada e aplicada pelo Grande Outro, para abrir caminho. O resultado é a aplicação do poder instrumentário à otimização da sociedade em nome de objetivos de mercado: a utopia da certeza (Zuboff, 2020, p. 452). O “Grande Outro” referido pela autora trata-se do “fantoche perceptível, computacional, conectado que renderiza, monitora, computa e modifica o comportamento humano”, em alusão ao Grande Irmão orwelliano, que, agora, em sua versão aprimorada, não serve mais somente para monitorar e vigiar a população, mas serve instrumento de engenharia comportamental capaz de prever e moldar o comportamento humano. O Grande Outro impõe a todos uma indiferença radical, uma equivalência sem igualdade, transformando pessoas e também objetos em informações legíveis ao sistema computacional, passível de processamento, predição e modelagem (Zuboff, 2020, pp. 427-428), concretizando a diferenciação deleuzeana do indivíduo, característico da sociedade disciplinar foucaultiana, do divíduo moderno, caracterizado pela identificação através de uma cifra, de uma senha, e pela divisibilidade de suas particularidades em informações cognoscíveis ao sistema, característico da sociedade de controle, nos termos propostos por Deleuze (2013, p. 226). No entanto, o conhecimento gerado através do big data e cultuado pelo dataísmo, anunciado como um conhecimento absoluto, é, em verdade, um conhecimento bastante rudimentar. O data mining ou a mineração de dados, isto é, a obtenção massiva de dados privados e públicos, apenas descobre e realiza as correlações existentes entre determinadas informações. Segundo Han, a correlação representa a forma mais precária de saber na lógica hegeliana, uma vez que a correlação não explica o porquê A sucede a B e vice-versa, apenas atesta esta sucessão. A correlação indica tão somente a probabilidade, não a necessidade, ou seja, não estabelece um conhecimento preditivo com precisão absoluta. O big data proporciona apenas
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