Raízes e ramificações: a Justiça de Transição na América Latina em tempos de covid-19

95 RAÍZES E RAMIFICAÇÕES: A JUSTIÇA DE TRANSIÇÃO NA AMÉRICA LATINA EM TEMPOS DE COVID-19 tados apocalípticos que produzem, especialmente, aos direitos humanos, ao meio ambiente ou, em geral, às condições concretas de vida no planeta terra, pressupõem um ir além dos pilares tradicionais da Justiça de Transição. Conforme já explicado, o ponto central reside na sua condição de possibilidade de servir enquanto medida hábil à antecipação e para o controle dos riscos globais, provocados, particularmente, pelo modo de ser, acelerado e concorrente, pressuposto de uma agenda neoliberal. Talvez, servindo a devida diligência como mais um “interdito fundador”, em referência aos trabalhos de Delmas-Marty177, para reduzir o espaço de discricionariedade dos Estados e das empresas frente às novas crises. Feitas as considerações acerca do standard da devida diligência, importa melhor compreender o caminho que a pesquisa vem percorrendo para a investigação da extensão dos fundamentos da justiça de transição, em particular, no contexto da pandemia da covid-19. Além do que já foi exposto sob a perspectiva histórico-filosófica de um passado autoritário que não foi superado nas sociedades latino-americanas, há outra razão que reforça a constatação de uma relação particular entre um período marcado por violações massivas aos direitos humanos e a exigência da justiça transicional. O objetivo não é apenas restaurar ou apaziguar a sociedade, mas contribuir efetivamente para sua transformação, garantindo justiça às vítimas das violações de seus direitos, preservando a democracia e, por fim, 177 No quarto tomo da sua obra Les forces imaginantes du droit, ao refletir sobre a formação de uma comunidade internacional de valores, Delmas Marty usa o exemplo do direito penal, campo que considera mais sensível ao universalismo, para mostrar que o desenvolvimento do direito humanitário, estabelecendo os limites em casos extremos de guerra (jus ad bellum e jus in bello) e do direito penal internacional, pela atividade do TPI, contribui para a constatação da existência de interditos à vocação universal. Tais interditos, a exemplo, daquilo que se pode considerar inumano (ex., os crimes contra humanidade), que poderão estabelecer um equilíbrio entre o relativo e o universal e permitir escapar ao “chaos post-moderne”, sem ceder aos riscos dos fundamentalismos que as sociedades contemporâneas começam sentir. DELMAS-MARTY, Mireille. Les forces imaginantes du droit (IV): vers une communauté de valeurs? Paris: Seuil, 2011. p. 27-42.

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