Anais do XXI Seminário Internacional Nanotecnologias, Sociedade e Meio Ambiente desafios jurídicos éticos e sociais para a “grande transição sustentável” (XXI SEMINANOSOMA) 58 Ainda pelo entendimento de Facchini Neto, “a periculosidade deve ser aferida objetivamente, pela sua própria natureza ou pela na- tureza dos meios empregados, e não em virtude do comportamento negligente ou imprudente de quem agiu. Neste contexto, forçoso retornar à análise da boa-fé objetiva como uma norma de conduta, um standard ou padrão ético-jurídico, consubstanciada através de uma cláusula geral39 que se inspira na ló- gica solidarista e personalista introduzida pela Constituição Federal.40 Por se tratar de um conceito indeterminado, confere ao juiz ampla margem de apreciação de cada caso concreto, o que facilita sua ade- quação ao desenvolvimento tecnológico,41 principalmente à nanotec- nologia, que não dispõe de uma legislação específica. Ressalte-se que, quanto à nanotecnologia, nem os cientistas, fabricantes e, muito menos, os consumidores, sabem exatamente os efeitos tóxicos que poderão advir destes produtos, o seu ciclo vital e as suas interações com o meio ambiente a saúde dos seres humato, portanto, que suporte ele os ônus correspondentes”. E, prosseguindo à fundamentação da decisão, baseada no dispositivo em comento, enfatiza-se que é estendido a quaisquer ati- vidades que sejam potencialmente nocivas à esfera jurídica das pessoas e de seus semelhantes, bastando à concretização de tal potencialidade para surgir a obrigação de indenizar. Isso corrobora o foco atual da responsabilidade em prol das vítimas, que deverão ser ressarcidas em virtude de um dano injustamente causado, ainda que decorrente da prática lícita de uma atividade. É o que demonstra parte do voto a seguir: “Impõe-se que vítimas que sofram da- nos injustos sejam reparadas. E quem causa tal dano é que o deve reparar, por ter colocado em movimento um instrumento potencialmente lesivo, criando um perigo para os demais concidadãos. Embora se trate de uma atividade lícita, o dado que interessa é que se trata de uma atividade potencialmente danosa. Quando essa potencialidade de causar danos se concretiza, quem criou o risco deve suportar suas consequências.” (RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Terceira Turma Recursal Cível. Recurso Inominado no 71001727908. Relator: Des. Eugênio Facchini Neto. Porto Alegre, 23 set. 2008. Disponível em: http://www. tjrs.jus.br Acesso em: 24/10/2024). 39 Para Almeida Costa, o princípio da boa-fé objetiva não é autoexecutável, ao referir que: “O legislador enuncia um princípio, estabelece um projeto ou plano de regulamentação que envia ou comete ao juiz. E este deverá partir das exigências fundamentais da ética jurídica, que se exprimem na virtude de manter a palavra e a confiança, de cada uma das partes proceder honesta e lealmente, segundo uma consciência razoável, para com a outra parte, interessando as valorações do círculo social considerado, que determinam expectativas dos sujeitos jurídicos”. (ALMEIDA COSTA, Mário Júlio de. Direito das Obrigações. 11. ed. rev. e atual. Coimbra: Almedina, 2008. p. 122-123). 40 TEPEDINO, Gustavo. Liberdade de escolha, dever de informar, defeito do produto e boa-fé objetiva nas ações de indenização contra os fabricantes de cigarro. In: ANCONA LOPEZ, Te- resa (coord.). Estudos e pareceres sobre livre-arbítrio, responsabilidade e produto de risco inerente: o paradigma do tabaco: aspectos civis e processuais. Rio de Janeiro: Reno- var, 2009. p. 208. 41 ALMEIDA COSTA, 2008, op. cit., p. 120 e 121.
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