XXI SEMINANOSOMA

Anais do XXI Seminário Internacional Nanotecnologias, Sociedade e Meio Ambiente desafios jurídicos éticos e sociais para a “grande transição sustentável” (XXI SEMINANOSOMA) 76 pelos danos que o seu veículo possa causar (independentemente de os deslocar a posteriori para uma seguradora; aliás, os seguros automó- veis serão imprescindíveis nesta sede, devendo, como já sucede com os automóveis tradicionais, ser obrigatórios). Portanto, defendemos a aplicação de uma responsabilidade pelo risco21: utilizar um VA será uma actividade perigosa, potencialmente causadora de danos. As vantagens desta actividade justificam que seja lícita (até porque se estima que o número de acidentes diminuirá substancialmente, visto o VA ser programado para respeitar limites de velocidade e demais regras de trânsito22), mas quem usufruir dela há-de responder pelos riscos ine- rentes à sua utilização. Este princípio geral parece-nos correcto e razoável, tanto em termos jurídicos como em termos éticos. É justo que assim seja. No entanto, apesar de esta solução nos parecer a mais adequada, poder- -se-ia pensar que não tem respaldo na letra da lei. A responsabilidade subjectiva é o regime-regra no ordenamento jurídico português, só podendo aplicar-se a responsabilidade objectiva nos casos especial- mente previstos na lei (cfr. art. 483.º, n.º 2, do Código Civil). Não existe uma norma geral que determine que quem usufruir de uma actividade perigosa (mas lícita) responde pelos danos provocados nesta sede23. Assim, é necessário encontrar uma norma específica que preveja responsabilidade objectiva neste âmbito24. O art. 503.º do Código Civil português, que é a norma base da responsabilidade civil objectiva por acidentes causados por veículos, estabelece que quem responde pelos danos provenientes dos riscos 21 Nos termos definidos por Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 12.ª ed., Coimbra, Almedina, 2009 (7.ª reimpressão em 2019), p. 613. 22 “Especificamente, deseja-se uma redução significativa nos acidentes rodoviários e dos cus- tos relacionados, o que levará a diminuição dos custos associados aos seguros. Prevê-se que os veículos autónomos aumentem o fluxo de tráfego, proporcionam uma maior possibili- dade de mobilidade para crianças, idosos, pessoas com deficiências, na medida em que os viajantes são dispensados das tarefas de condução e navegação. Com este tipo de condução (autónoma) espera-se ainda que tenha um impacto direto na diminuição do consumo de combustível, na redução das necessidades de espaço de estacionamento, no incremento de novos modelos de negócios para o transporte como um serviço, especialmente através da economia compartilhada”, Paulo Novais /Pedro Miguel Freitas, «Inteligência Artificial e Regulação de Algoritmos», op. cit., p. 23. 23 Em edição anterior (Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 7.ª ed., Coim- bra, Almedina, 1998, p. 533), o autor explicava que “[r]azões de certeza e de segurança ju- rídica leva[ram] o legislador a especificar as actividades perigosas que constituem fonte de responsabilidade”. Uma cláusula geral encontraria muitas dificuldades na sua delimitação (cfr. nota de rodapé n.º 3 da p. 533 desta obra). 24 No sentido de, em face do art. 483.º, n.º 2, não ser admissível a aplicação analógica das normas relativas à responsabilidade pelo risco, Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, Direito das Obrigações, 15.ª ed., Coimbra, Almedina, 2018 (reimpressão em 2020), p. 374.

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