Sistemas, tempos e espacos: o Lab-Mundi em dez anos de fazer historiográfico

148 Comércio, informações e diplomacia: o grão-ducado da Toscana e o império português no Atlântico (1580-1640), breves apontamentos historiográficos e metodológicos Grão-Ducado da Toscana, que ao mesmo tempo em que delineia projetos expansionistas encontra-se cada vez mais dependente da atividade mercantil de ingleses e holandeses, que por meio de suas frotas navais inundam o Mediterrâneo em fins do século XVI, bem como de capitais e da experiência mercantil de cristãos-novos portugueses, que por meio de suas redes que se estendiam à América, Ásia, e Norte da Europa, fomentavam o comércio de produtos coloniais e influenciavam a política econômica do estado governado pelos Medici. Isto porque, após 1492, a economia-mundo europeia começa a englobar dentro de suas lógicas outros espaços que vão além do continente e da região banhada pelo Mar Mediterrâneo. O processo de colonização das Ilhas Atlânticas, o início das conquistas espanholas na América e a navegação lusitana pela Rota do Cabo ocorrem simultaneamente ao início do declínio manufatureiro dos Estados italianos, em especial de Veneza, que entre fins do século XVI e início do XVII começa a se acentuar; um declínio que não se deve apenas a fatores endógenos, mas sobretudo à atlantização da economia- -mundo europeia e das escaramuças com os Otomanos.23 Este processo é uma constante, de acordo com Fernand Braudel: é o centramento, descentramento e recentramento da economia-mundo, com uma mudança de seu eixo de gravidade e que leva à uma reordenação espacial de seus arranjos. O Mediterrâneo, assim, passa paulatinamente a ser um espaço cada vez mais dependente das fortunas hispânicas que projeta seu poder na Itália nos séculos XVI e XVII – em intensas disputas com a França, mas no geral levando a melhor em um primeiro momento –, e com o comércio a partir de uma posição crescentemente desfavorável com holandeses e ingleses, que “Se volcaron sobre las riquezas existentes en el mar Interior y se apoderaron de ellas empleando todos los médios, mejores o peores”.24 Abordaremos em trabalho futuro inclusive a relação de dependência mercantil da Toscana em relação aos ingleses, pois as potências do Noroeste Europeu em ascensão, em primeiro lugar, projetaram seus controles mercantis no Báltico e no Mediterrâneo diante das crises de abastecimento de grãos e do aumento da pirataria otomana e tivo, para Wallerstein o movimento contínuo da economia-mundo faz com que ocorram alterações de status em momentos de mudanças significativas, que podem significar uma ascensão ou um movimento descendente. Mudanças estas que são regulares, mas não necessariamente contínuas, e que levam a alterações no poder político e econômico de determinados estados e/ou localidades dentro do sistema interestatal, típicas da semiperiferia, região intermediária da economia-mundo. Importante é que Wallerstein também afirma ser uma constante dos estados semiperiféricos iniciativas políticas e econômicas que visam alterar esta condição, mas que, ao contrário das expectativas, “Only a few succeed in significantly transforming the rank of their state in the world division of labor. This is because the very success of one eliminates opportunities and alternatives for other” (WALLERSTEIN, Immanuel. The Modern World-System II: Mercantilism and the Consolidation of the European World-Economy, 1600-1750. Berkeley; Los Angeles; Londres: University of California Press, 2011. p. 179). 23 BRAUDEL, Fernand. The Perspective of the World. Nova Iorque: Harper & Row, 1984. (Civilization & Capitalism, 15th-18th Century, 3). p. 136-137. 24 Ibidem, p. 94-95.

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