15 Rafael de Bivar Marquese experiência de discussões coletivas entre docentes e discentes na Linha de Pesquisa Escravidão e História Atlântica, que concebi e ajudei a fundar no início de 2004. Quando, em razão de diferenças teóricas e pessoais insuperáveis, a Linha naufragou no meio do Atlântico (algo que se deu mais ou menos por volta do final de 2007), meus orientandos de então ficaram sem a referência de um grupo coletivo de discussões, haja vista que eu promovia apenas reuniões individualizadas com eles. Alguns tomaram a iniciativa de fundar seu próprio grupo de estudos, com colegas de pós-graduação alunos de outros orientadores. Confesso que isso chegou a me gerar certo sentimento de culpa por não encabeçar a montagem de um novo grupo coletivo de pesquisa. Mas, como havia clara organicidade no que eu estava fazendo individualmente com cada um de meus orientandos, a culpa rapidinho foi embora. Aqui na USP, as coisas continuaram nesse passo – eu orientando discentes em reuniões individualizadas, vez por outra trazendo professores convidados como Reinaldo Funes, Schmidt-Nowara e Edward E. Baptist para ministrar cursos curtos de pós-graduação, sempre conversando nos corredores e fora da universidade sobre história e historiografia com João Paulo – até julho de 2012, quando participei de um seminário fechado da Second Slavery Research Network na Universidade de Colônia, organizado por Michael Zeuske. Em férias familiares na Alemanha, Sven Beckert, professor em Harvard, havia sido avisado por Zeuske a respeito do seminário; interessado em saber mais sobre a perspectiva e o grupo da Segunda Escravidão, apareceu por lá, mesmo sem estar escalado na programação. Beckert o fez feito um foguete: acompanhou apenas a primeira sessão do primeiro dia (que não foi a minha), almoçou conosco (quando tivemos rápida conversa) e se mandou. Algumas semanas depois, mandou-me um e-mail, pedindo-me o texto que eu apresentara em sessão posterior, um longo artigo que escrevi por ocasião do centenário de nascimento de Eric Williams, no qual tratei tanto da recepção de sua obra na historiografia brasileira quanto de sua validade para a compreensão da economia escravista cafeeira brasileira e mundial no longo século XIX.5 Em poucos dias, ainda no mês de agosto de 2012, Beckert enviou-me nova mensagem, dizendo-me que meu texto se aproximava bastante do que ele estava fazendo em seu projeto em vias de conclusão, sobre a história global do algodão, soltando por fim uma pergunta desconcertante: há gente praticando História Global no Brasil? 5 Para a publicação no Brasil, ver MARQUESE, Rafael de Bivar. Capitalismo, Escravidão e a Economia Cafeeira do Brasil no longo século XIX. Saeculum, João Pessoa, v. 29, p. 289-321, 2013. Esse texto foi originalmente preparado para um seminário que ocorreu na Universidade de Oxford em outubro de 2011, servindo de base para o prefácio que escrevi para uma nova tradução de seu livro clássico (ver WILLIAMS, Eric. Capitalismo e Escravidão. Trad. de Denise Bottmann. São Paulo: Companhia das Letras, 2012 [1944].
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