Sistemas, tempos e espacos: o Lab-Mundi em dez anos de fazer historiográfico

150 Comércio, informações e diplomacia: o grão-ducado da Toscana e o império português no Atlântico (1580-1640), breves apontamentos historiográficos e metodológicos religiosos e políticos –, há menções muito relevantes sobre o Brasil27. Como é caso de sua carta de 10 de outubro de 1578 a Baccio Valori, membro de uma importante família florentina que se exilara de Florença em 1537, mas que preservara seus bens ao transferi-los à terceiros, tendo sido o próprio Baccio a recuperá-los. Posteriormente, tornou-se cavaleiro da Ordem de Santo Stefano e bibliotecário da Biblioteca Medicea Laurenziana. Nesta longa carta, Sassetti descreve a grande presença de escravos africanos em Lisboa, empregados em diversos setores da economia urbana da capital do Reino, e também nas possessões ultramarinas, como Cabo Verde e Madeira, o forte de São Jorge da Mina, o Brasil, e, além do Cabo da Boa Esperança, em Moçambique. No que se refere ao Brasil, afirma Sassetti que o açúcar brasileiro é de maior qualidade se comparado ao das Ilhas, e em grande quantidade. Ademais, relata que é no Brasil que vive Filippo Cavalcanti, “il quale ha grandissime faccende alle mani, ed è uomo di grande autorità, e quasi soprastante a tutto, infino al proprio governatore. Dicono che e’ tiene gran corte con molti paggi e cavalli […]”; toda esta riqueza acumulada e que permite esta pujança, relata, vêm de seus engenhos de açúcar.28 A outra tipologia de fontes abordadas, as correspondências de agentes e diplomatas, aproxima-se do conteúdo das cartas e relatos de viajantes, embora sejam mais pragmáticas quanto ao tom utilizado e ao conteúdo em si29. Esta tipologia, devemos esclarecer, não deve se limitar apenas aos encarregados toscanos na Península Ibérica (Lisboa, Madrid e Sevilha), mas também aos estabelecidos em Londres e Amsterdam, centros mercantis em ascensão. Vale dizer que esta tipologia documental apresenta uma maior bidirecionalidade, ou seja: podemos nos valer não apenas das missivas produzidas nestes locais, bem como das diretrizes e curiosidades florentinas aos seus encarregados. Para estes casos, interessantes são os relatos de Jan van der Nessen, um flamengo a serviço dos toscanos, autor de diversas missivas aos grão-duques, secretários e comerciantes em Livorno, Pisa e Florença. Mas para esta exposição, escolhemos a carta de Belisario Vinta, político toscano que chefiara importantes missões diplomáticas à Roma e Veneza, e que defendia uma política de neutralização da potência hispânica, sendo favorável à aproximação entre o Grão-Ducado e a França. Em 5 de fevereiro de 1594, Vinta recomendara ao embaixador em Madrid Francesco di Agnolo Guic27 Sobre Sassetti, ver o estudo introdutório da recente edição de seus escritos realizado por Corey Tazzara (TAZZARA, Corey. Filippo Sassetti on Trade, Institutions and Empire. Londres; Nova Iorque: Routledge, 2023). 28 SASSETTI, Filippo. Lettere Edite e Inedite di Filippo Sassetti (Raccolte e Annotate da Ettore Marcucci). Florença: Felice Le Monnier, 1855. p. 122-125. 29 Algumas cartas importantes foram publicadas no artigo de Sérgio Buarque de Holanda aqui mencionado, embora os arquivos toscanos, em especial de Florença, guardem ainda muitas cartas e relatos ainda inéditos.

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