16 Um balanço pessoal sobre a primeira década do Lab-Mundi/USP (2013-2023) Não tenho a mínima ideia, foi o que pensei responder. Até 2012, eu simplesmente não havia parado para prestar muita atenção na moda avassaladora da História Global. Tudo o que havia lido a respeito até então me parecia teórica e metodologicamente frágil, sobretudo frente à potência da perspectiva analítica do sistema-mundo, com a qual vinha trabalhando desde o doutorado e que informara diretamente tanto o projeto sobre paisagem e arquitetura como o da política da escravidão. Procurando ser educado, esclareci Beckert que dentre os pesquisadores da escravidão por aqui, certamente não, não havia gente praticando História Global. Porém, prossegui, o tipo de preocupação que expressei no texto que ele havia lido em realidade estava ligado a um momento do passado historiográfico brasileiro que havia se notabilizado exatamente pelas perspectivas de análise abrangente, de teor globalizante. E, nisto, terminei, não estava sozinho, pois colegas meus que trabalhavam com outros temas também nutriam uma visão positiva sobre os legados historiográficos brasileiros e latino-americanos – ao escrever isso, pensei nas conversas que sempre tive com João Paulo Pimenta a respeito do assunto, e que vinham se acentuando após o término do Temático Fapesp. Beckert tem algo de empreendedor schumpeteriano. Eis sua réplica: estou criando com pesquisadores da Holanda e da Índia uma rede de História Global “truly Global” e precisamos de parceiros na América Latina. Você e seus colegas com interesses próximos aí no Brasil não gostariam de se juntar a nós? Ao levar o teor dessa troca para João Paulo, nós dois imediatamente pensamos: por que não? Pode ser algo passageiro, simples expressão de uma moda historiográfica, mas de todo modo não custa nada ver como é esta cena. No entanto, a coisa não se desenrolou imediatamente. Ficamos cozinhando a ideia da criação de mais um laboratório no Departamento de História (houve um momento, na segunda metade da década de 2000, em que eles brotaram em nossa instituição como cogumelo depois da chuva) por todo o segundo semestre de 2012. Sua criação foi formalizada somente em abril de 2013, tendo nós dois como coordenadores. Tomada a decisão, como batizá-lo? Diante dessa geleia geral que é o campo da História Global, por que não inscrever no nome do laboratório uma referência comum à nossa formação como historiadores e que antecipou muito do que é a atual agenda desse campo? João Paulo vinha de uma linhagem historiográfica que tinha na obra de Fernando Novais uma de suas matrizes, e cujas afinidades eletivas com as múltiplas variantes da teoria da dependência e da perspectiva de sistema-mundo eram mais do que evidentes. Do meu lado, fui leitor assíduo de Immanuel Wallerstein no mestrado e no doutorado, algo que em realidade carregava da graduação – o curso de História Moderna I e II que fiz em 1991 com meu orientador na graduação, no mestrado e no doutorado, Antônio Penalves Rocha, muito se valia dele. Depois, o trabalho com Tomich solidificou
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