Sistemas, tempos e espacos: o Lab-Mundi em dez anos de fazer historiográfico

169 Kelly Eleutério Machado Oliveira Em Plymouth, na Inglaterra, os estudantes publicaram cartas, proclamações, requerimentos, sátiras etc denunciando as mazelas da travessia e as precárias condições às quais estavam submetidos. Trocaram os livros pelas armas na defesa obstinada do liberalismo e se viram obrigados a seguir o caminho do exílio português. Muitos estudantes, contudo, permaneceram em Portugal. Os acadêmicos que, por vários motivos, não deixaram Coimbra foram alvos de uma ferrenha vigilância do Conservador da Universidade. Isso se passou, sobretudo, com os estudantes brasileiros como nos mostra o aviso de 24 de outubro de 1828 no qual consta os nomes de dezoito deles.18 Aos olhos da repressão, particularmente os brasileiros, foram vistos como “mal-intencionados”, todos eles tidos como envolvidos com o liberalismo. Muitos deles requereram do governo brasileiro subsídios para retornar ao Brasil e se matricularem em Olinda, uma vez que eram perseguidos “por serem brasileiros”.19 Contribuiu para reforçar as suspeitas sobre os brasileiros um ofício recebido pelo encarregado da Comissão de Polícia do Porto em agosto de 1828. O registro trazia a notícia de que “tem aparecido muitos brasileiros com laços de sua nação”, possivelmente uma alusão ao tope nacional, um emblema criado em setembro de 1822 por d. Pedro I, causando rumores e que “alguns portugueses por abuso os tem trazido chegando a tal excesso que nos ditos laços intermediaram a cor azul com letras iniciais V. M. 2ª”.20 Ao verde e amarelo, alguns portugueses acrescentaram o azul, a cor que simbolizava os liberais, diferentemente do encarnado associado aos miguelistas. Como se vê, em Portugal, especialmente sob o jugo de d. Miguel, o “ser brasileiro” se tornou ainda mais complexo. Irmanados, brasileiros e portugueses afirmavam, por meio de símbolos e emblemas, os laços de união em defesa de d. Maria da Glória, a futura rainha d. Maria II, em quem d. Pedro I tinha abdicado da coroa. Se aqueles que ficaram em Portugal tiveram que enfrentar o violento regime de d. Miguel, aqueles que partiram para o exílio enfrentariam outras mazelas. Foi o que se passou com Sátiro Mariano Leitão e sua travessia desde as terras da Galiza até chegar no Barracão, nome dado ao local que abrigou os emigrados, em Plymouth, no sul da Inglaterra. As cartas de Sátiro Mariano Leitão, escritas e publicadas em finais de 1828, podem ser inseridas no esforço que muitos liberais tiveram em constituir, no exílio, uma imprensa que fosse capaz de reforçar a defesa da causa, veicular 18 Arquivo da Torre do Tombo. Estudantes brasileiros que permaneceram em Coimbra. Intendência Geral de Polícia, mç 287, outubro de 1828, p. 268. 19 Biblioteca Nacional do Brasil. Representação dos estudantes de direito da faculdade de Coimbra que pretendem continuar os estudos em Olinda por serem brasileiros. Manuscritos. Coimbra-Rio de Janeiro: (s.n), 1828. 20 Arquivo da Torre do Tombo. Correio de 27 de agosto de 1828. Secretarias e extractos. Intendência Geral de Polícia. Livro 230, p. 140v e 141.

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