206 A transformação da China: autofortalecimento, modernização e crise alfandegárias do país, sob o comando de um irlandês chamado Robert Hart, que agiu com sucesso no incremento da cobrança de impostos para o Estado, a aceitação do uso de tecnologias ocidentais (ferrovias, telégrafos, eletricidade), a necessidade de industrializar o país e, portanto, importar maquinário, o estímulo para viagens ao exterior de autoridades do alto escalão do governo e o incentivo para que chineses estudassem em países ocidentais. Além disso, houve reformas no currículo escolar em diferentes níveis e a fundação da Universidade de Pequim em 1898.24 Os exemplos acima mostram um movimento de muitos “países atrasados”, para usar a terminologia de Alexander Gerschenkron. Contudo, quais foram as premissas essenciais desse programa de autofortalecimento? Para Simon Kuznets, o crescimento econômico moderno foi um momento da história em que a ciência passou a ser aplicada a “problemas de produção econômica e bem-estar humano”. Trata-se de uma época de impulsionamento da aplicação da ciência que se iniciou em meados do século XVIII com “invenções empíricas” e que, a partir da segunda metade do século XIX, tomou um rumo de aplicação “consciente e sistemática de descobertas científicas básicas a problemas da produção econômica e do bem-estar humano”. O caráter consciente e sistemático das descobertas científicas e sua aplicação é crucial na definição do autor. Kuznets chama a atenção para dois pontos dessa definição. O primeiro refere-se justamente à noção de aplicação. A aplicação da ciência impulsionou as pesquisas científicas, incentivando ainda mais o crescimento econômico. Esse processo é fundamental para compreender o caráter “moderno” do crescimento econômico. O segundo aspecto relaciona-se à busca incessante pela resolução dos problemas de produção, visando ao bem-estar humano. Claro que uma possível definição de bem-estar é restrita, especialmente se considerarmos a realidade do momento histórico da segunda metade do século XIX até o início do século XX na China. Contudo, a busca para resolver problemas de produção e satisfazer o bem-estar humano são determinantes para entender o caráter “moderno” do crescimento econômico na definição desse autor. Para Kuznets, “[...] a tecnologia baseada na ciência e as concepções amplas necessárias para sua exploração bem-sucedida pelas sociedades humanas foram tão dominantes nos países que mantiveram um crescimento econômico moderno, que constituíram um traço característico da época econômica moderna”.25 O princípio do autofortalecimento refletiu a tentativa da China de aplicar a ciência ocidental para resolver seus problemas militares, produtivos e econômicos. A modernização que Zeng Guofan tentou colocar em prática exemplifica essa abordagem. Em junho de 1863, Li Hongzhang (o conde Li) 24 KUO; LIU, op. cit.; CHANG, op. cit.; SPENCE, op. cit.. 25 KUZNETS, Simon. Crescimento econômico moderno: ritmo, estrutura e difusão. São Paulo: Abril Cultural, 1983. p. 12-15.
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