Sistemas, tempos e espacos: o Lab-Mundi em dez anos de fazer historiográfico

212 Disputa de temporalidades. Comentário às reflexões teóricas sobre o tempo no Lab-Mundi discussão estéril, na qual vivência e experiencia são duas formas do tempo totalmente opostas. Portanto, ele sugere duas coisas mais interessante e, a meu ver, mais frutíferas. Primeiro, que os tempos históricos estão constituídos pela coexistência entre vivências e experiencias, e que ambas têm potencias criativas imensas. E, segundo, que há eventos que são simultaneamente vivências e experiencias. O exemplo que Pimenta usa em seu escrito é muito ilustrativo. Durante a Era das Revoluções, ouvir uma notícia sobre o que estava acontecendo em outros lugares do mundo podia ser, para muitos, apenas uma notícia, algo que depois de um tempo podia ser esquecido ou simplesmente ignorado. Porém, para outros, essa mesma notícia podia se converter em uma possibilidade, em um chamado para imaginar novos regimes políticos. Ao final, um evento é uma vivência ou uma experiência dependendo de como os sujeitos experimentam vivências particulares. Essa questão leva Pimenta a argumentar que uma vivência também pode se tornar uma experiência na longa duração. Citando o trabalho de Braudel, Pimenta mostra que entre os séculos XV e XVIII, as estruturas de longa duração foram constituídas por vivências cotidianas que foram tão duradoras quanto as experiencias. Portanto, as vivências podem ser tão importantes quanto as experiências e, além disso, tornar-se nelas na longa duração. É, ao final, um processo duplo. Mas isso me leva a plantear algumas perguntas: uma vivência só pode ser tornar uma experiência na longa duração? Por exemplo, a tomada de consciência sobre a importância de defender o meio ambiente em relação ao aquecimento global – caso que Pimenta menciona – ou o avanço e defesa dos direitos da comunidade LGBTIQIA+ são fenômenos que têm acontecido rapidamente. Então, é possível que haja vivências que se tornem em experiências através de processos de aceleração do tempo? E podemos considerar coisas que tradicionalmente temos considerado como vivências – como a decisão de comer certas coisas e não outras – como experiências nas sociedades contemporâneas? Estou pensando, neste caso, em pessoas que têm decidido ser veganas ou vegetarianas por questões políticas relacionadas com a preservação do meio ambiente. A politização de um evento pode transformá- -lo tanto em uma experiência quanto em uma vivência? A pesquisa de Isabela Souza de Rodriguez sobre as disputas acerca de diversas concepções de liberdade e trabalho na Revolução Haitiana nos permite seguir refletindo sobre a importância de entender a coexistência de diversos regimes de tempo nos processos históricos. Autores como Laurent Dubois explicam que a melhor forma para entender a Revolução Haitiana é focar nos diferentes projetos políticos que emergiram durante todas as etapas do conflito.3 Embora o argumento do Dubois seja totalmente válido, Souza de Rodriguez nos mostra 3 DUBOIS, Laurent. Avengers of the NewWorld: the story of the Haitian Revolution. Cambridge: Harvard University Press, 2005.

RkJQdWJsaXNoZXIy MjEzNzYz