224 Representações visuais de consumo de bebidas estimulantes, 1630-1815 em que quase nenhuma publicação desse tipo era ilustrada, retrata um sujeito chinês segurando sua xícara de chá próxima ao peito, um otomano exibindo a sua diante de si, e um indígena permanecendo de pé, segurando sua própria taça de chocolate quente. A cena já foi interpretada como uma referência ao tipo de visão europeia sobre cada espaço de produção desses artigos, uma reflexão sobre as reservas chinesas ao acesso estrangeiro às regiões produtivas de chá, a abertura levantina do comércio de café e à completa disponibilidade do cacau. Há, ainda, uma hierarquização entre esses espaços, denotando a riqueza chinesa e otomana em contraste com a estranheza dos costumes americanos, demonstrada pelo seu posicionamento distinto dos demais e o seu olhar distanciado, apontado para o oeste da composição. O frontispício de Dufour ilustra de modo mais explícito algo que pode ser visto implicitamente em toda a produção imagética sobre estimulantes quando vista de modo serializado e em conjunção com uma perspectiva alargada que considere a produção como elemento construtor dessa visualidade. Quando esse livro foi publicado, as três bebidas eram caras e inacessíveis, com consumo restrito à aristocracia e a setores intelectualizados que as bebiam como curiosidade.17 De modo semelhante, a produção imagética que incluiu esses importados nesse período era aristocrática, com gravuras ilustrando seus passatempos, a imagem de Dufour e as ilustrações mais um tratado contemporâneo.18 Menção deve ser feita às ilustrações botânicas produzidas nesse mesmo período, outro tipo de imagem importante para esses processos de apropriação botânica europeia.19 Essa conexão auxiliou a criar um amálgama de interpretações do chocolate como uma bebida excessivamente sensual e luxuriosa e ligada aos exageros do estilo de vida da nobreza, o que dá um caminho interpretativo para entender porque ela aparece sobretudo em representações desse setor social até o fim do século XVIII.20 17 JAMIESON, op. cit., p. 274. 18 BLEGNY, Nicolas. Le bon usage du thé, du caffé et du chocolat pour la préservation et pour la guérison des maladies. Paris: Chez Estienne Michaellet, rue S. Jacques, à l'Image S. Paul, 1687. 19 EARLE, Rebecca. The body of the conquistador: Food, Race and the Colonial Experience in Spanish America, 1492-1700. Cambridge: Cambridge University Press, 2012. 20 Isso embasou argumentos que interpretaram as diferenças nacionais do consumo de cada bebida como religiosas. SCHIVELBUSCH, Wolfgang. Tastes of paradise: a social history of spices, stimulants, and intoxicants. New York: Vintage Books, 1993.
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