Sistemas, tempos e espacos: o Lab-Mundi em dez anos de fazer historiográfico

228 Representações visuais de consumo de bebidas estimulantes, 1630-1815 em algo que se assemelhasse ao estilo de vida aristocrático. Entretanto, dentro de tais permanências, observa-se uma gradual assimilação desses importados às identidades de certos grupos sociais do noroeste europeu. No fim do século XVIII, isso se tornaria ainda mais intenso, ao ponto de, no início do século XIX, o café e o chá serem considerados não mais como produtos importados de natureza exótica, mas como parte quase natural da identidade e cotidiano de alguns desses países. A expansão colonial cafeeira no Caribe, século XVIII, e o aprofundamento da presença britânica na Ásia, são fatores frequentemente interpretados como essenciais para um segundo momento no consumo das bebidas. Somam-se a isso reformas fiscais de fins do século XVIII, que impactaram diretamente no comércio das bebidas. Houve, então, expansão na qualidade de café e chá disponíveis em diversos preços. Esse momento foi interpretado por Arrighi como um ponto de virada no início do caos sistêmico que, após 1815, consolidaria a hegemonia britânica e o capitalismo enquanto modo de produção e sistema econômico.29 Concomitantemente a esses conflitos, houve um momento de imenso interesse em na imprensa, que tive como espaços de reprodução as cafeterias nos centros urbanos. Muitos desses espaços foram retratados na forma de caricaturas e sátiras. Conclusão Dentro da temática do consumo de estimulantes encontram-se múltiplas perspectivas de mundo, formas de representação, e perspectivas de futuro em um período de profundas transformações que incluem, mas não se limitam à dieta europeia. Para gêneros específicos, esse movimento fica muito claro: retratos familiares carregam expectativas de prosperidade e, ao serem pendurados em casas de campo,30 pertencem a um longo processo de construção identitária de uma classe proprietária que depende da contínua atuação para manter-se no poder. Na sátira política das gravuras do conturbado fim do setecentos, os estimulantes serviam para a memorialização de processos históricos que seriam retomados como símbolo de valores nacionais como liberdade e civilidade. Nos retratos de mulheres solitárias com xícaras e canecas, seu impacto é mais incerto, ora como parte da criação de perspectivas de dignificação familiar de casais de comerciantes, ora como reforço de valores protestantes e prescrições ao comportamento feminino diante de um mundo em que críticas a frivolidade das mulheres também cresciam. Nesse período, imagens de consumo de estimulantes atuam como instrumentos de elaboração de um mundo 29 ARRIGHI, op. cit., 2006, p. 52-54. 30 RETFORD, op. cit., 2017, p. 1-31.

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