Sistemas, tempos e espacos: o Lab-Mundi em dez anos de fazer historiográfico

268 As imagens e os Tempos A imagem foi produzida por Thomas Ender, pintor, desenhista e gravador austríaco que chegou ao reino do Brasil em 1817 acompanhando a expedição dos naturalistas Spix e Martius por motivo do casamento de D. Leopoldina com Pedro de Alcântara, herdeiro da Coroa portuguesa.33 O desenho apresenta parte da floresta do Morro do Corcovado, suas árvores, o espaço de seus rios, e três diminutos personagens ao fundo que dão dimensão da grandeza da natureza que o pintor apresenta e diante dela são de menor importância. No momento em que contemplamos o desenho há nesse ato a adição de mais uma temporalidade, a do nosso presente, que impele a interpretações dos símbolos e conceitos contidos na imagem que remetem aos tempos passados registrados nessa representação. A imagem traz alguns aspectos interessantes que devem ser ressaltados: coloc-se diante do observador o tempo da natureza, um tempo longo, que foi retratado simultaneamente junto ao tempo curto do instante idealizado pelo pintor, no caso aqui Thomas Ender. Destaca-se também a contraposição de tempos que há dentro e fora da imagem entre a floresta tropical longeva, que já se encontrava estabelecida antes do momento da pintura, que não fora organizada para posar diante de Ender, e se manteria, por lógica, para além daquela geração; esse tipo de reprodução da natureza era uma novidade em termos de tradição na arte, não se tratava de reproduzir a natureza pura e simplesmente, mas sim, conceber uma ideia.34 Como já dito previamente, a ideia era valorizar a vista, e principalmente a vista que serviria ao gosto daquilo que os europeus, público final da arte, queriam apreciar; era a representação de fato de um mundo que, nas palavras de Braudel, fora descoberto pela Europa através dos olhos.35 Era um momento em que o Reino do Brasil se inseria no horizonte de expectativas do público europeu em face de ter sido até aquele período um segredo dos potugueses. Ao se deperar com uma paisagem completamente nova – lembrando que era muito comum essa modalide de artista fazer tours pela Europa Ocidental observando e desenhando as paisagens europeias como complemento de seus estudos –, o artista daquele período colocava em ação seus sentidos e era experimentado por algo inédito tendo em vista que a experimentação ocorre a partir das experiências pregressas, no caso, relacionada com as imagens naturais de paisagens vistas pela Europa.36 33 BOSCOV, Sarah Tortora. Thomas Ender. In: OLIVEIRA, Cecília Helena de Salles; PIMENTA, João Paulo (org.). Dicionário da Independência do Brasil: História, Memória e Historiografia. São Paulo: Edusp; Publicações BBM, 2022. p. 344-345. 34 DIENER; COSTA, op. cit., p. 81. 35 BRAUDEL. Fernand. Civilização material, economia e capitalismo. Séculos XV-XVIII. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2009, v. I. p. 45. 36 BELLUZZO, Ana Maria. O viajante e a paisagem brasileira. Revista Porto Arte: Revista de Artes Visuais, Porto Alegre, v. 15, n. 25, p. 17-57, nov. 2008. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/PortoArte/article/ view/10514; BELLUZZO, Ana Maria. Brasil dos Viajantes. São Paulo: Metalivros, 1994. 3. v.

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