274 Experimentos laboratoriais: tempo, espaço, estrutura e agência em um estudo sobre os correios do Brasil desafios à Coroa portuguesa: grosso modo, de um lado havia a continuação do esforço reformista ilustrado em regenerar o Reino por meio de políticas econômicas envolvendo as colônias; de outro, havia um fundamentado temor em relação à soberania portuguesa na América após as revoltas, revoluções e conflitos imperiais que estavam ocorrendo nos últimos anos. Nesse contexto, o tempo das comunicações entre Lisboa e a América se tornou uma questão de articulação territorial. Diplomatas, secretários de Estado, governadores e comerciantes do mundo português expressaram, com bastante diversidade, em várias conjunturas do século, uma expectativa de aceleração e regularidade das comunicações à distância. Com ressalvas distintas, a esperança de muitos era de que, com um sistema postal organizando a circulação epistolar, o governo do Estado e a vitalidade comercial poderiam ser aperfeiçoados, as distâncias entre colônias e metrópole encurtadas. Os intervalos de tempo que pautavam a conexão entre territórios portugueses estavam sendo concebidos como um fenômeno aberto à intervenção da sociedade, como algo mutável ao longo da história. Nesses termos, como a teoria pode contribuir para examinar o tempo como um fenômeno histórico e social? Nos anos 1940, o historiador Marc Bloch escreveu que o tempo da história “é o próprio plasma em que se engastam os fenômenos e como o lugar de sua inteligibilidade”.3 A história seria a ciência dos homens no tempo porque a duração constituiria a atmosfera na qual o pensamento histórico se desenvolve. Assim, o tempo seria, simultaneamente, continuidade e mudança, de cuja relação se formariam os vínculos entre as sociedades ao longo da história. Por essa razão, o “historiador nunca sai do tempo”, “ele considera ora as grandes ondas de fenômenos aparentados que atravessam, longitudinalmente, a duração, ora o momento humano em que essas correntes se apertam no nó poderoso das consciências”.4 A precisão da perspectiva do historiador poderia ser mensurada a partir do manejo adequado dessas diversas formas temporais à natureza dos fenômenos analisados, pois o tempo humano na história – rebelde à uniformidade – é variável e multiforme. Por isso, parte das condições de inteligibilidade da história dependeria, em alguma medida, de uma sensibilidade à pluralidade dos ritmos do tempo. Essa lição foi levada adiante, em 1958, por outro historiador, Fernand Braudel, que escreveu que “a história é a soma de todas as histórias possíveis”.5 Ao historiador caberia considerar esse campo de possibilidades por intermédio de uma dialética das durações, através de uma perspectiva que observasse as re3 BLOCH, Marc. Apologia da história ou o ofício de historiador. Rio de Janeiro: Zahar, 2002. p. 55. 4 Ibidem, p. 135; 150; 153. 5 BRAUDEL, Fernand. História e Ciências Sociais. A Longa Duração. In: BRAUDEL, Fernand. Escritos sobre a História. São Paulo: Perspectiva, 2005. p. 53.
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