Sistemas, tempos e espacos: o Lab-Mundi em dez anos de fazer historiográfico

28 Entre a História Comparada e a perspectiva do Sistema Mundo A leitura e os debates sobre as obras de Wallerstein estabeleceram um dos paradigmas fundantes do Lab-Mundi. O modelo interpretativo do Sistema Mundo propõe uma leitura da modernidade a partir da formação e expansão de dois fenômenos integrados: a economia-mundo capitalista e o sistema interestatal. A unidade de análise em questão prima tanto por um recorte espacial expandido, de pretensões globais, quanto por uma hierarquia entre escalas, classificadas a partir de categorias como centro, semiperiferia e periferia. Ao mesmo tempo, a montagem do sistema remonta ao século XVI, de modo que a compreensão de sua dinâmica histórica exige uma perspectiva de longa duração. Essa interpretação sobre as origens e a dinâmica do capitalismo diverge tanto das matrizes liberais quanto do marxismo ortodoxo e dialoga diretamente com a obra de Fernand Braudel. Wallerstein define a economia-mundo capitalista como um fenômeno que integra simultaneamente as esferas da produção, da circulação, do consumo e das finanças, e que contempla distintos regimes de trabalho. Ao mesmo tempo, o sociólogo se valeu do conceito da luta de classes para interpretar a formação das estruturas sociais características de cada escala de análise, e explicar como as classes dominantes instrumentalizam os aparatos estatais para defenderem seus interesses na arena exterior e no mercado mundial. Ainda que a leitura de Wallerstein tenha suscitado divergências, é preciso reconhecer que seu legado influenciou a primeira geração de pesquisadores do Lab-Mundi em suas interpretações sobre o Brasil (e outras experiências locais, regionais ou nacionais) em sua inserção no sistema mundial.3 Influenciado por Wallerstein, Dale Tomich desenvolveu uma nova interpretação sobre a relação entre capitalismo e escravidão a partir da Era das Revoluções. Tomich reconheceu as contribuições de Wallerstein para se superar as definições ortodoxas que reduzem o capitalismo a um modo de produção ou sistema econômico oriundo da Revolução Industrial e fundado no regime de trabalho assalariado. Por outro lado, Tomich criticou a relativa mecanicidade do modelo e das escalas de análise do Sistema Mundo, assim como a definição da economia-mundo capitalista como um mesmo fenômeno entre os séculos XVI e XX. Nesse sentido, Tomich propõe uma compreensão um Conceito: Capitalismo Histórico e a Historiografia sobre a Escravidão Brasileira. Revista de História, n. 169, p. 223-253, 2013; e MARQUESE, Rafael; DALE, Tomich. O Vale do Paraíba Escravista e a Formação do Mercado Mundial do Café no Século XIX. In: GRINBERG, Keila; SALLES, Ricardo (org.). O Brasil Imperial. Volume II – 1831-1870. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2009. p. 21-56. 3 WALLERSTEIN, Immanuel. O Sistema Mundial Moderno I. Porto: Afrontamento, 1993; WALLERSTEIN, Immanuel. Capitalismo Histórico & Civilização Capitalista. Rio de Janeiro: Contraponto, 2001. Ver ainda BRAUDEL, Fernand. Civilização Material, Economia e Capitalismo, Séculos XV-XVIII. São Paulo: Martins Fontes, 1996. 3 v; e ARRIGHI, Giovanni. O Longo Século XX: Dinheiro, Poder e as Origens de Nosso Tempo. Rio de Janeiro: Contraponto; Editora Unesp, 1996.

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