Sistemas, tempos e espacos: o Lab-Mundi em dez anos de fazer historiográfico

281 Thomáz Fortunato também pelos correios, o bloqueio comunicacional que Juntas de Governo dessas regiões haviam imposto às suas cartas, e atitudes da mesma natureza estavam ocorrendo em escalas provinciais.22 Até aquele momento, os correios haviam contribuído para a integração territorial da América portuguesa e para a soberania da monarquia; porém, quando o império começou a desmoronar, essa função estruturante dos serviços postais passou a ser subvertida pelos agentes políticos. Em outras palavras, uma estrutura estava sendo transformada por agências políticas, e um modelo teórico contribuiu para a compreensão dessa dinâmica. Em 2005, o historiador William Sewell Jr. escreveu que as estruturas devem ser consideradas em sua dualidade, como o meio de realização das práticas sociais e seu resultado, pois elas “moldam as práticas das pessoas, mas são também as práticas das pessoas que constituem (e reproduzem) as estruturas”. As estruturas, ao mesmo tempo que restringem a agência, também a viabilizam.23 Os esquemas virtuais e os recursos reais que a compõem demonstram a integração entre dimensões concretas e abstratas; e, embora toda agência seja estruturalmente condicionada, sua relativa autonomia permite que esquemas sejam transpostos ou que seus recursos sejam reinterpretados. Assim, à agência está resguardada uma capacidade de transformação estrutural, por mais que sua realização ocorra por meio das estruturas e, inversamente, a reprodução estrutural também depende da agência. Desse modo, a estrutura é dinâmica, resultado e matriz de uma agência que, com ela, forma “interações dialéticas por meio das quais os humanos modelam sua história”.24 Quando, em 17 de agosto de 1822, o periódico Conciliador do Maranhão anunciou a decisão da Junta de Governo de São Luís sobre a proibição dos correios de distribuir qualquer correspondência vinda do Rio de Janeiro, uma mudança importante estava começando a ocorrer.25 A rede de correios estava sendo mobilizada para um projeto contrário às finalidades originais dos serviços postais. Parte das ações do governo do Rio de Janeiro e da Junta de São Luís continuavam condicionadas pelos correios, no entanto, o novo uso que os governos concorrentes estavam fazendo iniciava um processo de subversão estrutural de uma rede que havia sido construída para a integração territorial da monarquia portuguesa. Parte da agência política desses grupos estava assentada na circulação de notícias, entretanto, com projetos políticos concorrentes, os próprios meios de circulação de notícias estavam sendo politizados e reinventados sobre novas bases que, por sua vez, correspondiam a 22 FORTUNATO, op. cit., p. 340-377. 23 SEWELL JR., William. Uma teoria da estrutura: dualidade, ação e transformação. In: SEWELL JR., William. Lógicas da história: teoria social e transformação social. Rio de Janeiro: Vozes, 2017. p. 135; 143. 24 Ibidem, p. 158. 25 FORTUNATO, op. cit., p. 372-373.

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