Sistemas, tempos e espacos: o Lab-Mundi em dez anos de fazer historiográfico

282 Experimentos laboratoriais: tempo, espaço, estrutura e agência em um estudo sobre os correios do Brasil integrações territoriais de corpos políticos cujas fronteiras ainda se encontravam em disputa. Embora estivesse ocorrendo uma transformação radical nos sentidos da rede postal, o vínculo que tornava as ações políticas condicionadas por esta estrutura não havia sido cindido, mas este elo tampouco era capaz de determinar os usos da sociedade que o criou. *** Toda análise é teoricamente orientada. Teorias constroem unidades, estabelecem relações e definem campos de significado para elementos da realidade fornecendo meios de racionalização do real. Objetos se tornam fontes por meio de teorias, as quais esboçam o horizonte dentro do qual certas perguntas e hipóteses fazem sentido, definindo os problemas pertinentes para o entendimento do real que elas próprias ajudaram a organizar. O método entra nessa operação como o meio pelo qual perguntas podem ser respondidas a partir das fontes existentes. Mas o real nunca coincide perfeitamente com a teoria que busca racionalizá-lo, fontes sempre são fragmentárias e as interpretações estão submetidas à temporalização das perspectivas dos intérpretes.26 Diante de um mundo contemporâneo que nos ensina a rebeldia do real a interpretações universais, que resposta poderiam os historiadores oferecer que não um ecletismo teórico radicalmente historicista? Assim como historiadores do passado nos ensinaram a importância de criar ferramentas capazes de tornar o pensamento do historiador mais sensível à plasticidade do tempo, os historiadores de hoje podem escolher ampliar a dialética entre epistemologia e realidade. Para isso, a realização de experimentos científicos dentro de uma comunidade teoricamente engajada que mobiliza um conjunto pluralista de métodos para responder perguntas diferentes sobre temas relacionados parece um bom começo. Que ambiente melhor para a realização desse trabalho do que um laboratório? Afinal, as leituras realizadas coletivamente criaram condições para que a história dos correios pudesse ser contada como uma história da construção social de tempos da comunicação, uma história da invenção de uma geografia em rede cuja formação envolveu sucessivas articulações entre eventos singulares e processos de longa duração, conectados a demandas da economia-mundo capitalista e aos desafios impostos por um sistema-mundo moderno. Auxiliaram na demonstração de congruências entre a morfologia espaçotemporal dos correios e a experiência política dos contemporâneos que, condicionados pela estrutura da rede postal, não deixaram de, com seus projetos, reinventar os significados políticos dos correios em uma conjuntura de crise profunda. Assim, o Novo Tempo do Mundo, do qual falava Arantes, pôde adquirir uma 26 KOSELLECK, op. cit., 2006, p. 161-188; SILVA, Maria B. Nizza da. K. R. Popper e a epistemologia da História. Revista de História, v. 52, n. 103 (2), p. 547-576, 1975.

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