Sistemas, tempos e espacos: o Lab-Mundi em dez anos de fazer historiográfico

62 A semântica histórica da experiência e as categorias de análise de Koselleck no estudo das dinâmicas de transição em grandes potências tóricas de “espaço de experiência” (ou Erfahrungsraum na expressão original de Koselleck) e de “horizonte de expectativa” (ou Erwartungshorizont).2 Apesar de os objetos históricos estarem embebidos em um evento trágico e traumático, ressalta-se que não serão as categorias de análise a nos permitir acessar a realidade histórica, os acontecimentos ou fatos circunscritos cronologicamente entre os anos finais da guerra. Elas servirão, na verdade, para nossa compreensão da realidade passada ao nos permitir expor aspectos ainda não acessados nas experiências dos referidos Comitês. Não sendo categorias alternativas (como podem ser “senhor e escravo” ou “amigo e inimigo”), mas dependentes (“não se pode ter um sem o outro”), como lembra Koselleck,3 elas se apresentam particularmente interessantes para uma análise das intensas experiências de planejamento de um pós-guerra que foi produzido durante a própria guerra. Constituindo categorias que nos possibilitam entender distintas possibilidades de “ser” e, como lembra o historiador alemão, das tensões que resultam dessas diferenças, elas nos permitem alcançar diversos entendimentos de tempos históricos para os agentes americanos e britânicos naquele presente incrustado entre 1942 e 1945. Ademais, ao apresentarem o potencial de indicar uma condição humana universal (todos experimentam e esperam em suas vidas), elas permitem encontrar novos sentidos e relativizar narrativas históricas que entendem ter sido original (e exclusiva) a experiência imediata da guerra. Enredam-se, assim, passado e futuro naquele presente beligerante. Faz-se importante, como consequência, não analisar esse momento passado apenas através do entendimento que os contemporâneos tinham de suas ações e ambições, como se pudessem ser medidas de forma equivalente. As categorias de “experiência” e “expectativa” não coordenam passado e futuro; não nos sistematizam um simples tipo de manifestação instantânea de um agente histórico; não são semelhantes. A qualidade efêmera da “experiência”, em nosso caso, refere-se ao entendimento do que a guerra, como síntese, havia, ou não, transformado, manifestado no instante em que surge a decisão e a ordem para que os referidos Comitês lancem seus trabalhos. A expectativa, diferentemente, não pode ser assim finita. Ela é complexa e se projeta sobre o futuro e sobre seus copiosos momentos temporais. Em realidade, o fato de novos eventos da guerra, ou seja, de novas “experiências” continuarem a surgir após o início dos trabalhos dos Comitês não invalida a possibilidade de se entender que novas “expectativas” surgiam, sendo até mesmo possível notar sua evolução, produzindo uma história sobre futuros. 2 KOSELLECK, R. Futuro Passado. Rio de Janeiro: Contraponto, 2006 [1979]. p. 15-16, p. 305 e p. 309-314. 3 KOSELLECK, op. cit., p. 307.

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