Sistemas, tempos e espacos: o Lab-Mundi em dez anos de fazer historiográfico

68 A semântica histórica da experiência e as categorias de análise de Koselleck no estudo das dinâmicas de transição em grandes potências te consciente de que o planeta se tornava interdependente e pequeno. Para ele, as novas tecnologias, especialmente na aviação, estavam impulsionando tal mudança21. Roosevelt acreditava que o poder aéreo, muito mais do que o poder marítimo, transformava-se na principal arma para se vencer a guerra, mas também para projetar poder no futuro e, com ele, influência e paz.22 A mesma percepção de mundo que o encorajou a defender a entrada americana na guerra antes mesmo de Pearl Harbor levou-o a lançar a preparação da regulamentação da aviação civil internacional do pós-guerra e dos novos dispositivos de segurança internacional, para além de uma nova ordem política e econômica global. Nesse sentido, em 28 de dezembro de 1942, o Presidente ordenou ao JCS que lançasse estudos sobre possíveis localizações para aeródromos e instalações aeronáuticas de uma “Força Policial Internacional” (International Police Force) em todo o mundo, para que Washington pudesse estar preparado quando chegasse o momento das negociações de paz.23 O JCS, por sua vez, atribuiu a tarefa ao Joint Strategic Survey Committee of the United States (JSSC- -US), um comitê conjunto entre as forças armadas recentemente criado, cuja missão era desenvolver estudos integrando o interesse nacional e a estratégia global dos EUA.24 O JSSC-US tornou-se, assim, uma das organizações mais influentes dentro do governo americano. Na análise de tal contexto, as lentes kosellequianas nos ajudam a entender tal comitê para além de sua curta cronologia de 1942 a 1945 e de sua suposta natureza exclusivamente militar. Ao mesmo tempo, a administração americana não ignorava as muitas outras implicações que tais decisões poderiam provocar a nível global. Na verdade, como Andrew Priest explicou recentemente ao estudar a inserção internacional dos Estados Unidos entre a Guerra Civil e o final do século XIX, as reflexões americanas sobre o mundo também foram moldadas (e fortemente influenciadas) pelas relações com os impérios de então.25 Em meados do século XX, enquanto o colonialismo era considerado uma instituição em extinção por Roosevelt e sua administração, ao lidar com os mundos e realidades que entidades como os impérios britânico e português criaram, e opor-se a eles, a potência dos Estados Unidos continuou a ser moldada por condições deter21 CASEY, op. cit., p. 216 e p. 219-220. 22 DOBSON, A. FDR and the Struggle for a Postwar Civil Aviation Regime: Legacy or Loss? In: WOOLNER, D.; KIMBALL, W.; REYNOLDS, D. (org.). FDR’s world: war, peace, and legacies. Nova Iorque: Palgrave Macmillan, 2008. p. 196-210; SHERRY, M. The Rise of American Air Power. The Creation of Armageddon. New Haven: Yale University Press, 1987. p. 76-82. 23 FDRPL. Franklin Roosevelt Papers. Map Room– caixa 162. Memorandumde 28/12/42, McCrea-Leahy. 24 STOLER, op. cit., p. 104-109 e p. 137-138. 25 A argumentação de Priest pode ser considerada como renovando ou complementando reflexões clássicas da geopolítica daquele tempo, como os trabalhos de Alfred Mahan (PRIEST, Andrew. Designs on Empire. America’s rise to power in the age of European Imperialism. Nova Iorque: Columbia University Press, 2021).

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