A mudanca como fenomeno no cuidado em saude

115 Cadernos do PAAS, volume 11 - A mudança como fenômeno no cuidado em saúde experienciada no momento; sobre os jogos que dissera querer jogar naquela semana; e a tentativa que ele despertasse para que fosse viável seu atendimento. No entanto, por três sessões ele dormiu. Entendeu-se o sono de Gabriel como um indicativo do espaço que precisava para conseguir lidar com as mudanças ocorridas recentemente. As crianças e os pais adotivos vivenciam, assim como os biológicos, a mesma experiência de filiação, no entanto, há características inerentes ao processo de adoção que demandam um esforço maior (Levinzon, 2018). Para Gabriel, houve um esforço de apresentar-se a este casal como um “bom menino”, com possibilidades de que pudesse tornar-se um “bom adotado”, como utiliza a autora (Levinzon, 2018). Passadas as três sessões de son(h)o, Gabriel transfere progressivamente seu foco nas sessões para “mamãe e filhinho”/“irmãzinha e irmãozinho”, simbolizando o processo que estava vivendo no momento com o casal. Assim como nos sugere Duarte (2009, p. 142), o brincar e o que a criança expressa com suas brincadeiras e jogos, representa o que se passa em seu mundo interno, “equivale à linguagem verbal, ao símbolo, que ao mesmo tempo mostra, revela e esconde, resistindo, ou seja, ao resistir mostra escondendo”. Ao encenar com frequência a relação mamãe- -filhinho ou irmãzinha-irmãozinho, Gabriel traz um novo elemento à psicoterapia: a almejada ascensão social enquanto fantasia acerca da adoção. Gabriel, enquanto passava pelo processo de aproximação com este casal, candidatos à adoção, também fantasiava nas suas brincadeiras que a partir dali seria rico, colocando o oposto, a pobreza, na terapeuta que encenava ser sua mamãe ou irmãzinha. Eram marcados por ele no espaço físico da sala, marcava quais ambientes eram para ele, o rico, e quais a mamãe/irmãzinha deveria ficar destinados aos pobres. O menino idealizava e simbolizava objetos que observava nesta nova configuração familiar que surgia e tantas novas mudanças com que lidava no momento. Criava celular, cartões de crédito e relógios como objetos “de rico” e afirmava repetidamente que ele tinha e os usava por esta mesma razão. No entanto, ao utilizar objetos comuns ao cotidiano para simbolizar sua nova realidade, Gabriel também nos contava, de modo simbólico, da riqueza que era estar finalmente tendo a oportunidade de uma família em quem poderia confiar. Com a aproximação e a posterior

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