A mudanca como fenomeno no cuidado em saude

78 Cadernos do PAAS, volume 11 - A mudança como fenômeno no cuidado em saúde O voluntariado como ponte sob a correnteza de perdas múltiplas As enchentes do Rio Grande do Sul nos trouxeram uma experiência inesperada. Interrompemos nossas práticas de estágios para nos encontrarmos com muitas outras, como se estivéssemos vivenciando diferentes estágios, em distintos contextos, simultaneamente. A Psicologia se transformou intensamente para nós, assumindo lugares diferentes. Passamos a ressignificar saberes e posturas e nosso olhar e ouvir, ganharam dimensões e consistências diferentes, passando a enxergarmos e escutarmos também com o olfato e com o tato. Em um cenário de perdas múltiplas, o que passou a dar sustentação aos sujeitos foi a sensação de poderem ser vistos e ouvidos. A melhor intervenção passou a ser perguntar se já haviam se alimentado, se gostariam de um pouco de água, se poderíamos ajudar de alguma forma. Nosso desafio constante foi sustentar a dor e a vida, de forma incansável, tal qual nos lembrou Noal (2017), a gente não vai sem medo, mas vamos apesar dele. Em um contexto de trauma coletivo, a dor seguia sendo subjetiva e procuramos sustentar nossas intervenções atentas às singularidades. Assim como a água entrou pelas brechas, foi também através delas que nos fizemos efetivas. Esperamos que, ainda que o abrigo tenha sido temporário, que o acolhimento não seja e siga reverberando naqueles que escutamos. Que a dor continue a encontrar espaços de escuta, que as mobilizações se mantenham porque agora há outras frentes para serem pensadas. As únicas certezas que ficam são a aposta, mais viva do que nunca, nos coletivos e na necessidade de manter pelo menos um pouco dessa força que mobilizamos para seguirmos construindo outros caminhos, nos posicionando frente às cobranças necessárias e tencionando o sistema para que políticas públicas mais efetivas se organizem frente a situações de emergências e desastres em nosso estado. Acreditamos que escrever sobre nossa experiência é uma forma de elaborar tudo que vivemos, mas também de se somar na luta por melhores condições sociopolíticas. Foram dias de muito colo, de muito aperto de mão, de uma infinita coleção de olhares e histórias. De “consegue uma muda de roupa pra mim?”, “será que a água baixou?”, “me ajuda a achar meu filho?”, “brinca comigo?”, “me ajuda a fazer a mamadeira dela?”, “pode sentar aqui no meu colchão!”, “quando a gente vai se ver de novo?”. Compartilhamos cafés da tarde, grupos, chimarrões e o Dia das Mães. Olhamos a vulnerabilidade do

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