A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia: contribuições para o MERCOSUL

Jamile Bergamaschine Mata Diz e Pedro Campos Araújo Corgozinho 28 Isso não significa, contudo, que o papel de interpretação do Tribunal de Justiça tenha se esgotado nesse campo, ao contrário, deve-se analisar, ainda, a delimitação da competência em prol de uma atuação mais protetiva dos direitos fundamentais, especialmente baseada na dicotomia entre sistemas nacionais e sistema comunitário, e.g., quando a norma nacional é mais protetiva que a norma europeia, como foi o caso Melloni de 26 de fevereiro de 2013,34 que tratava de execução bancária sobre dívida carente de escritura pública contra particulares. Baseado na ausência de disposição expressa sobre a competência da União nesta matéria, o Tribunal encerrou a questão que fazia referência a direitos fundamentais sem nem mesmo enfrentá-la. Em todo caso, o aspecto central, que diz respeito à primazia da norma comunitária face à norma Constitucional (e que chegou a ameaçar o efeito útil do ordenamento comunitário, como já exposto), parece não ter sido resolvido a contento pela adoção da Carta. Quando se observa a argumentação usada pela Alemanha e Itália ao afirmar a prevalência das respectivas Constituições sobre a norma comunitária, nota- -se, ainda, uma divergência entre os tribunais nacionais e o comunitário, conforme se depreende também do caso Melloni. Os dois países já haviam alegado, quatro décadas antes, que as normas nacionais possuíam maior grau de proteção dos direitos fundamentais, garantido por suas Constituições, em favor de um sistema menos protetivo, qual seja, o comunitário. Como vimos anteriormente, tal rebelião contra a primazia da norma comunitária fora um dos fatores que levaram o TJCE a repensar a observância dos direitos fundamentais individuais na aplicação do direito comunitário. Ora, no acórdão Melloni foi justamente a ordem jurídica comunitária que teve sua aplicação reafirmada pelo Tribunal, a saber: a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia primando sobre a Constituição espanhola, embora esta fosse mais protetiva. Como assevera Sarrión: En este sentido, se puede afirmar que aunque es cierto que el TJUE niega la interpretación del art. 53 planteada por el TC español en favor del nivel mayor de protección de los derechos fundamentales y reafirma la primacía del DUE; no lo es menos que permite el juego de los niveles en el caso de que la norma o acción nacional no esté totalmente determinada por el Derecho de la UE, es decir, que exista margen de maniobra por parte de los Estados, puesto que se posibilitaría la aplicación del estándar nacional siempre que sea mayor (no afecte al nivel de protección previsto por la Carta) ni afecte a la primacía, unidad y efectividad del DUE.35 Tal fato demonstra que, apesar do reconhecimento do efeito vinculante da Carta de Direitos Fundamentais e da CEDH, dado pelo art. 6º do Tratado de Lisboa, ainda não há uma interpretação do TJUE que possa ser considerada linear no que tange à 34 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA UNIÃO EUROPEIA (TJUE). Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 26 de fevereiro de 2013. Stefano Melloni contra Ministerio Fiscal (Processo C-399/11) Luxemburgo: TJUE, 26 fev. 2013. Disponível em: http://curia.europa.eu/juris/docu ment/document.jsf?docid=134203&doclang=PT. Acesso em: 25 jul. 2024. 35 SARRIÓN ESTEVE, op. cit., loc. cit.

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